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São Paulo

The Coffee Traveler by Ensei Neto

SENSORIAL

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Fermentações: Quando vinho e café convergem…

Thiago Sousa

Os Sabores e Aromas do Café tem origem em 3 momentos distintos: durante o processo de amadurecimento da fruta, em sua senescência e durante a torra.

Durante o processo de amadurecimento da fruta, denominado pelo botânicos como Ciclo Fenológico, dois são os Sabores formados: o Doce e o Ácido.

O Sabor Doce é definido pelo perfil de açúcares, enquanto que o sabor Ácido é resultante do processo respiratório. Durante a respiração, são dois os ácidos que podem ser formados: o Cítrico, presente em 100% das sementes de café, e o Málico, que caracteriza plantas cultivadas a grandes altitudes (mais de 1.800 m de altitude).

Um grupo de Aromas e Sabores que vem ganhando especial atenção dos cafeicultores em geral é aquele obtido por processos fermentativos logo que os frutos se tornam maduros. Ah, esse é o momento de glória romântica: morrer no auge!

Sim, os frutos do cafeeiro fazem parte de uma classe chamada pelos botânicos de Não Climatéricos, ou seja, que só amadurecem enquanto ligados à planta. No entanto, logo após atingir o ponto de Maduros, eles se desligam, começando, a grosso modo, sua morte.

Esse fruto possui entre a casca externa e a semente uma rica polpa composta de açúcares, alguns minerais e água, entre outras substâncias.  A casca externa tem características muito parecidas com a nossa pele: flexível, permite troca seletiva de material, porém, pode apresentar comportamento isolante.

O teor de açúcares fica em torno de 20%, mais do que suficiente para que um processo fermentativo possa ser desencadeado quando existe a combinação com temperatura por volta dos 40oC e ausência de Oxigênio.

Durante a colheita, os frutos colhidos ao longo do dia ficam alojados em cestos ou sacos onde, amontoados, sofrem com a quase ausência de Oxigênio e, por isso, quase sempre ocorre início de fermentações anaeróbicas.

As uvas viníferas, dentre os principais predicados para a elaboração de um vinho de alta qualidade, devem ter bom teor de açúcares. O processo fermentativo é desencadeado por um grande número de diferentes leveduras, que são microorganismos que possuem atuação exemplar em ambiente aquoso. Existem leveduras que promovem a conversão de açúcares de cadeia longa em açúcares simples como a Glicose, fundamental, por exemplo, para a obtenção dos alcoóis. Outras leveduras, tem como característica elaborarem moléculas que conferem à bebida notas de aroma e sabor como florais ou uma fruta fresca como a maçã.

Nos últimos tempos uma nova vertente que vem conquistando muitos adeptos é a dos vinhos com pequena passagem por madeira. Esses vinhos mais modernos (ou que simplesmente estão resgatando técnicas anteriores…) apresentam estrutura vibrante, com maior presença de notas de frutas frescas e menos austeras provenientes da madeira.

As sementes de café quando descascadas podem manter sua polpa e iniciar fermentação quando postas em grossas camadas, em manejo conhecido como Honey Coffee (na América Central) ou Fermentados a Seco (no Brasil). Com leveduras selvagens podem ser obtidas notas de aromas florais ou de frutas frescas, o que torna cada lote único, pois sua reprodução é extremamente limitada. Trabalhar com leveduras selvagens é como tentar a sorte em uma roleta de cassino, pois não se sabe ao certo quais as que estarão mais aptas a agir.

Cada levedura tem melhor atuação em condições de temperatura e de disponibilidade de materiais específicos, o que torna muito complexo e enigmático o resultado de uma fermentação em condições abertas como nos terreiros de café.

Existem diversas pesquisas no Brasil, Colômbia e alguns países Centro-Americanos que buscam mais dados sobre os processos de fermentação e os sabores que podem ser obtidos, sendo que alguns resultados promissores demonstram que num futuro breve pode se esperar razoável padronização nos resultados numa xícara de café.

Há hoje nítida tendência de maior oferta de lotes de café com características frutadas, algumas delicadas e elegantes, outras um tanto quanto exageradamente potentes, mas que, sem dúvida, representam essa nova vertente. A partir deste ponto, é notável a convergência entre a produção moderna de vinhos e de café!

O grande desafio dos cafeicultores reside no fato de que o cultivo do cafeeiro é na Natureza, que é um sistema aberto por excelência, o que aumenta o risco de resultados desastrosos.

Mas é a diversidade de condições e de resultados que torna rica a experiência de se experimentar cada nova safra

Do pó sairás… – 1

Thiago Sousa

Café, Café, Café.

Cafés Especiais. Cafés Excepcionais. Simplesmente café…

Preparar uma bela xícara de café ou mesmo uma jarra, envolve um processo que a ciência chama de Extração. Afinal, o que é essa tal de extração?

Extrair significa “retirar algo de dentro”, que, cá entre nós, seria a alma de cada semente do fruto do cafeeiro…  

Podemos pensar que até chegar à xícara, o grão de café (na verdade, a semente da fruta do cafeeiro) passa por três Vidas. O seu primeiro Ciclo de Vida, que ocorre ligada à planta, começa em cada Primavera, quando uma profusão de alvas e perfumadas flores se abrem e rapidamente se fecundam, tendo seu encerramento exatamente no momento em que todos os açúcares esperados se formam e essa frutase mostra avermelhada ou douradamente madura.

A vida da fruta junto à roça termina ao ser colhida, seguindo para o processo de secagem e beneficiamento, quando suas cascas são retiradas. É quando se dá seu segundo Ciclo de Vida, agora como Café Cru (=  Green Coffee) ou matéria-prima para a indústria de torrefação, seja de grande escala, seja artesanal. Este ciclo, para cafés de alta qualidade, é relativamente pequeno, não ultrapassando o tempo de uma nova colheita.

A próxima etapa é o processo de Torra do Café.

Podemos considerar o processo de torra como a sublimação da essência do grãozinho de café. Ele muda de forma e estrutura para deixar sua essência ainda mais evidente!

Uma torra magistralmente conduzida, respeitando-se todas as potencialidades que o grão carrega e que foram devidamente ungidas pelas influências geográficas em sua origem, adicionadas do toque de artesão do produtor, faz vir à tona toda a riqueza de aromas e sabores. Fecha-se outro Ciclo de Vida, o de matéria-prima, para dar lugar ao terceiro e de maior brilho para as pessoas: a da bebida. Este é um ciclo extremamente curto se comparado temporalmente com os anteriores, mas que possui uma magia incrível!

O café na xícara, independentemente do serviço, é amaterialização de sua essência , trazendo evidência à toda riqueza de aromas e sabores que estavam intangíveis desde a lavoura, ao mesmo tempo em que ele se pereniza em nossa memória sensorial! Traduzindo: ao preparar uma xícara de café estamos como que tornando suas qualidades perceptíveis aos nossos Sentidos e tornando o delicioso ato de beber em algo inesquecível, mesmo que dure poucos instantes.

É por isso que o preparo dessa maravilhosa bebida tem de ser executada com todo o rigor técnico e muita, mas muita emoção!Cada xícara preparada, seja como espresso, num coador de papel ou numsyphon, tem sua arte e técnica mais apurada a ser usada. Assim como toda obra de arte, preparar ou extrair um café tanto mais exuberante é se, além da inspiração na execução, uma série de regras e conhecimento forem empregadas em toda sua extensão.

Dois elementos são fundamentais na extração: a água e o moinho. 

A água é o elemento que vai extrair a alma do café ao passar pelo grão feito em partículas. Portanto, a Moagem dos grãos tem importância muito grande para que a extração seja eficiente. E para cada tipo de preparo de café, existe uma faixa de tamanho de partículas que dá melhor resultado. Por exemplo, a moagem para o espresso é fina, enquanto que para uma French Press (= Prensa Francesa) pode ser mais grossa. Ah, o tamanho médio das partículas também tem grande impacto no resultado!

O tamanho das partículas pode se estender por uma faixa mais ou menos extensa dependendo do tipo de moinho usado. E é isso que vamos ver em seguida…

Escarlate 27: De São Paulo a Maastrich

Thiago Sousa

O dia 17 de Março foi o último dia do complexo de competições junto ao 10. Campeonato Brasileiro de Barista, em São Paulo, SP.

Além da tão esperada final da competição de baristas, outra final, a do Coffee in Good Spirits,  prometia ser uma ratificação: o grande talento de Marco De la Roche.

Spirit é a palavra em inglês que se refere às bebidas espirituosas, como se diria em clássico português, ou seja, aquelas produzidas por destilação de uma bebida fermentada como o vinho. O Coffee in Good Spirits é a única competição em que uma bebida alcoólica deve fazer parte da receita.

Marco, que tem passagem pelos balcões de café, é apaixonado por bebidas, sendo hoje muito bem conceituado consultor emMixologia. Mas, duas coisas sempre me chamaram atenção: primeiro o seu tino perfeccionista e, por isso mesmo, o segundo, sua avidez em estudar e aprender. Sólido conhecimento técnico é que permite altos vôos conceituais.

Sua apresentação começou a ser arquitetada com muitos meses de antecedência a partir de algumas rabiscos básicos. Daí vem a fase de pesquisa para materializar sua inspiração.

Seu drink de assinatura que lhe conduziu ao Bi Campeonato em 2010, chamado de Monte Cristo, já dava mostra do potencial criativo de Marco, ao mesclar uma infusão de camomila preparada sob média-alta pressão, feita numa Aeropress.

E veio 2011.

O nome do seu novo drink de assinatura, Escarlate 27, já insinua o que está por detrás de sua concepção.

Escarlate é o nome que se dá à cor que tem o vermelho como predominante e um leve toque de alaranjado. Sim, o vermelho tem muito com a bebida…

O número 27, segundo Marco, indica o número de ingredientes que ele escolheu para essa composição!

Ufa! Escolher 27 elementos realmente foi um grande trabalho.

A idéia básica é um insinuante passeio pelos sabores vermelhos. Um profusão de frutas vermelhas faz parte desse passeio sensorial: framboesa, cranberry, mirtilo, groselha negra, amora, morango e cassis, entre outras. 

Flores? Sim, não poderiam faltar: rosas, hibisco e rosa mosqueta. Fazem parte, ainda, frutas cítricas como a laranja, e especiarias que vão da pimenta rosa ao gengibre, passando pela nóz moscada e canela!

A receita completa pode ser acessada através deste link: http://marcodelaroche.blogspot.com/2011/03/escarlate27.html

Como introdução, Marco preparou um livreto, primeira foto deste post, contendo fotos e descrição das bebidas de sua apresentação, o obrigatório Irish Coffee (que teve a feliz coincidência de ter a final no dia de celebração de São Patrício, dia 17 de Março!) e o Escarlate 27.

A execução do drink é deslumbrante, como mostra esta foto do DrinkLab.

Infusões à parte, o toque magistral estava não apenas na surpreendente cesta de frutas vermelhas em casca de gelo, mas o uso inusitado de uma fava de baunilha comocanudo!  Marco borrifou uma infusão de rosas e frutas vermelhas na cesta de frutas, potencializando a percepção aromática. O “canudo orgânico” levava o adocicado e perfumado toque da baunilha à bebida, cujo final destacava o sabor do café.

A riqueza de notas de aroma e sabor podem ser sentidas perfeitamente, num verdadeiro desfile onde cada classe de sabores se revela no momento certo. Simplesmente genial.

Esta criação vale não só uma viagem para Maastrich, Holanda, onde Marco representará o Brasil no campeonato mundial, mas para qualquer outro lugar ou até várias voltas ao mundo…

Experiências com Ben Kaminsky: explorando sabores.

Thiago Sousa

Domingo foi um novo dia…

Após o almoço, a primeira coisa que Ben me perguntou foi sobre uma sorveteria que tinha sorvetes com diferentes frutas, que ele nunca tinha visto. É uma pequena rede chamada Frutos do Cerrado e que tem um sortimento de sabores com frutas típicas do Cerrado, além de algumas da Amazônia.

Escolhemos uma série tão grande de sabores que a moça do caixa se espantou e disse: “Vixi, vocês estão mesmo com vontade de tomar sorvete, néin…” (um “néin” típico da região do triângulo mineiro).

O tempo ajudou com um calor perfeito para o teste. E lá fomos nós.

Gabiroba, Buriti, Cajamanga, Mangaba, Pequi, Graviola, Araticum, Cupuaçu e outros… foram 10 diferentes frutas, além de um inesperado Lichee!

A cada picolé, o mesmo ritual: Ben anotava o nome da fruta; do belíssimo livro Árvores Brasileiras, de Harri Lorenzi, Editora Plantarum, podia ver fotos da árvore, flores e frutos; e a degustação.

A descoberta de novos sabores, no caso tipicamente brasileiros do Cerrado, foi uma sessão muito bacana!

A conexão com os sabores comuns do Hemisfério Norte e o seu, diria, “limitado” vocabulário de sabores e aromas das frutas tropicais criaram situações divertidas.

Veja nesta foto a cara de felicidade do Ben quando ele desvendou o sabor da Graviola, que descreveu como uma mescla de banana com morango, de um milk shake que é o seu favorito!

Próxima “estação”: sais. Isso mesmo.

Estava com uma bela seleção de sais do arquipélago de Ryu Kyu, onde fica a Província deOkinawa, Japão, incluindo um maravilhoso exemplar que foi considerado o melhor na Exposição Mundial da Bélgica em 2008. De textura leve, porém de grande fluidez e intensidade, lembrava trufas. Obviamente, foi o preferido da nossa mesa…

A “estação” seguinte foi reservado aos chás Oolong de Taiwan, dos quais um incrível vencedor de um concurso internacional de qualidade de chás, valioso presente do Companheiro de Viagem Chen Chia-Chun, de Taiwan. Este exemplar é de um plantio high grown de chá, a cerca de 1.300 m de altitude!

A última “estação” foi a que mexeu com o “fraco” do Ben: seleção de queijos da Serra da Canastra, Cruzeiro da Fortaleza e Sacramento, este ao estilo Parmigiano, regados a uma cachaça orgânicaBendito Grau, produzida em Patrocínio pelo Companheiro de Viagem Danilo Barbosa.

Ben é vegetariano, da linha que aceita lácteos e ovos, e queijo é um dos seus alimentos preferidos.

Agora, da cachaça… ficou fã!

Sutilezas com a French Press

Thiago Sousa

Denominamos Cupping a prova sensorial de café, também conhecida no Brasil como Degustação.

Pela Metodologia de Avaliação de Café da SCAA (Specialty Coffee Association of America) temos a preocupação com 3 aspectos básicos no preparo da prova: o ponto de torra do café (com base num protocolo específico), o perfil granulométrico (pois há um estreita correlação entre o tamanho dos grãos e a perfomance de extração) e a especificação da água (características e serviço). 

Em linhas gerais, o SCAA Cupping tem o seguinte ritual:  

a) Após a moagem dos grãos, coloca-se o equivalente a 5,5% m/v (massa por volume) em cada xícara. Para se ter uma idéia do que isso representa, para uma xícara com capacidade de 150 ml, são necessários 8,25 gramas de café moído.

b) Empregamos 5 xícaras por razões de correlação estatística, ou seja, cada xícara corresponde a 20% do lote sob avaliação.

c) Água quase fervente, preferencialmente em torno de 93.C, é despejada em cada xícara, criando movimento suficiente para que todas as partículas façam contato.

d) Com a hidratação das partículas, ocorre a formação de uma Crosta na superfície, como pode ser observada nestas duas fotos (na primeira em vista de cima e nesta, lateralmente).

A crosta geralmente tem espessura entre 1,5 cm a 2,5 cm e é para onde os óleos seguem (lembre-se que o óleo tem densidade menor que a água – é mais “leve”), convivendo com muitas bolhas numa rica mescla de substâncias aromáticas, ar e gás carbônico residual da torra.

Portanto, é onde os aromas se concentram!

e) Após um período em torno de 3 a 4 minutos após a água ser despejada, é feita a “quebra da crosta”, sempre de forma gentil, pois assim é possível captarmos o maior número de notas aromáticas.

Não se deve misturar vigorosamente a crosta no restante do líquido, pois as notas aromáticas ficam diluídas e, portanto, sua percepção diminuida. É interessante observar que o primeiro minuto após a formação da crosta, quando o processo de expansão termina (lembra uma balão sendo inflado…), a liberação das primeiras notas aromáticas é muito intensa e já é possível se ter uma idéia da grandeza do “desfile olfativo” que teremos.

f) O turbilhão provocado pelo movimento da colher faz com que as partículas se precipitem, ficando os óleos sobre a superfície, como está nesta foto.

Veja que essa incrível quantidade de óleos é a que seria encontrada na superfície de um beloespresso, quando recebe o nome de crema (com uma mescla um pouco diferente desta em razão da extração sob alta pressão). A coloração destes óleos sobrenadantes está muito boa, indicando que houve um torra bem feita de um excelente grão de café.

g) Finalmente, essa camada de óleos é retirada para se iniciar o cupping propriamente dito.

Nesta foto pode ser vista a superfície do café após a retirada dos óleos.

O preparo com a French Press, que algumas pessoas chamam de Prensa Francesa no Brasil, se aproxima bastante da forma de preparar o café para o cupping. A grande diferença entre ambos é que tradicionalmente, após os 3 a 4 minutos de aguardo, no processo French Press o êmbolo é simplesmente colocado e acionado, ficando pronto para o serviço.

Num recente bate-papo com a Companheira de Viagem Isabela Raposeiras surgiu a idéia de se repetir o ritual do cupping antes de se colocar o êmbolo na french press.

Bem, fiz alguns testes e há uma certa diferença retirando-se a camada oleosa superficial antes da colocação do êmbolo, sim. Certamente os óleos criam uma camada em nossa boca que funciona, digamos, como um isolante, fazendo com que a percepção de certos sabores e até da acidez seja um pouco retardada em relação ao café preparados com a retirada dos óleos.

Em cafés com acidez mais sutil, essa percepção foi maior.

É um interessante teste e, talvez, um jeito diferente de preparar o café com a french press.