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MERCADO

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Sobre os desafios da produção de café – 2

Thiago Sousa

Há um ditado que diz que “O sapo não pula porque gosta; pula por precisão.”

Podemos entender que muito do que se faz é resultado da necessidade. No caso da Cafeicultura, a incorporação de tecnologias sempre se dá nos momentos de crise de preços, no fatídico período em que os preços vão ladeira abaixo, ou quando algum evento grandioso força a busca por novas paragens. É a tal da “precisão” que surge e faz o sapo pular…

Em 1975 ocorreu a Grande Geada, que modificou definitivamente a Geografia dos Cafés do Brasil. Com as plantações arrasadas pela Geada Negra, efeito resultante dos ventos glaciais que sopraram no Norte do Paraná, até então o mais importante Estado Produtor de Café do Brasil, não sobraram muitas opções aos cafeicultores daquela região para sua permanência na atividade. Muitos decidiram deixar as lavouras dizimadas pelo intenso frio, tomando rumo ao Triângulo Mineiro e o Alto Paranaíba, onde puderam adquirir propriedades bem maiores porque as terras eram muito mais baratas em relação às do Paraná.

A topografia plana do Cerrado, que faz o olhar se perder na imensidão de seus horizontes, de início agradou aos fugitivos da geada, assim como o seu clima continental peculiar, que se mostrava muito estável, e o solo, que também tinha tonalidade avermelhada, um tanto mais amarelada que a clássica Terra Roxa típica do Norte Paranaense.

Assim, os cafeicultores paranaenses foram se fixando em Araguari, Monte Carmelo, Patrocínio, São Gotardo e Carmo do Paranaíba.

A primeira decepção foi dada pelo solo avermelhado do Cerrado, que tinha fertilidade muito baixa, muita acidez e teores elevados de alumínio. Mais uma vez, a Natureza mostrou que faz tudo em equilíbrio: a maravilhosa topografia plana, que permite mecanização em quase todas as operações, tinha como moeda de troca a necessidade de forte correção do solo. Porém, foram esses desafios que fizeram com que os produtores se organizassem em associações que serviram de ponto de encontro para troca de experiências e conhecimento, dando origem à região mais organizada dos Cafés do Brasil: o Cerrado Mineiro.

Além dos tradicionais cafeicultores paranaenses, haviam muitos “novos” produtores, pessoas que mudaram de ramo para tentar a sorte na cafeicultura, estimulados pelas impressionantes cotações do café na Bolsa de New York (NY/CSCE). Para efeito de comparação, com 100 sacas de café beneficiado de 60 kg era possível adquirir um carro de bom nível da época, como um Passat, ou, para os dias de hoje, um veículo na faixa de R$ 90 mil.

Esse caldeirão de gente que tentava domar o pobre solo do Cerrado, bem como compreender seu clima que apresenta apenas 2 estações bem definidas (6 meses chuvosos com temperaturas altas no dia e forte insolação; 6 meses secos e com grande amplitude térmica), começou a manter estreita relação com os órgãos de pesquisa, o que permitiu que novas tecnologias fossem desenvolvidas e rapidamente disseminadas. Junto do plantio em renque (linhas com plantas relativamente próximas), que garante maior estabilidade da produção porque minimiza a bienalidade produtiva dos cafezais, novas metodologias de correção de solo passaram a ser empregadas, assim como um modelo inovador de programa nutricional das lavouras (maior parcelamento com quantidades definidas em razão de cada etapa do Ciclo Fenológico, que é o ciclo da fruta).

O resultado: produtividade com números que assombraram o mundo!

Ante os parcos 8 a 12 sacas de 60 kg líquido de café beneficiado por hectare, muitas lavouras do Cerrado atingiram média de 4 anos de 36 sacas/ha a 42 sacas/ha, sem falar em picos de 70 sacas/ha a 90 sacas/ha em algumas glebas.

Mas, o que parecia o Paraíso em forma de Cafezal, logo mostrou seu Calcanhar de Aquiles: o período de poucas chuvas ou de sua total ausência afetava impiedosamente as lavouras, tirando a produção por absoluta falta de água!

Esforços para desenvolver uma tecnologia revolucionária começaram no final dos anos 1980. Começava a história da Cafeicultura Irrigada, que teve Araguari como importante centro irradiador.

Duas correntes tecnológicas estavam sendo trabalhadas paralelamente: a Irrigação Localizada, que se iniciou também em Araguari, e que recebeu o nome de “Irrigação por Tripa”, aplicando a água junto aos cafeeiros, e a Aspersão, feita por canhões de água de alta vazão, cuja aplicação era em área total das lavouras. Logo uma terceira corrente surgiu, ainda mais revolucionária para a época, que foi o uso dePivot Central, que apesar de aplicar água, em área total, tem sua operação toda automatizada, e, finalmente, surgiu o Gotejamento como alternativa de maior precisão.

O resultado?

Novo salto de produtividade! Com a combinação da tecnologia de irrigação e o modelo de adubação parcelada, um novo patamar de números começou a se formar a partir do início dos anos 90 através de teorias idealizadas e conduzidas pelo agrônomo Roberto Santinato. A primeira lavoura irrigada que quebrou a barreira dos 100 sacos de 60 kg líquidos/ha estava plantada em Barreiras, BA, (lembram-se do Sr. João Barata?). seguindo-se de outras no Cerrado, incluindo-se a lendária Fazenda Lagoa Torta, que se tornou sinônimo dessa escola.

Números exuberantes, mas cujos custos de produção deixavam de ser razoáveis. Essa discussão deu início à busca ao ponto de equilíbrio entre Custo de Produção e Produtividade. E desde então o Custo de Produção passou a ser obsessivamente pesquisado, estudado e anotado em todas as origens produtoras.

De qualquer forma, o ponto de partida usado por Santinato foi muito instigante: qual seria o verdadeiro potencial produtivo de um cafeeiro?

Se sua capacidade produtiva era definida geneticamente, como essa função poderia ser trabalhada: com altíssimas produtividades e curto horizonte de tempo ou produtividades médias e tempo de vida mais prolongado?

Imaginando que uma área de 1 hectare tivesse potencial produtivo de 1.600 sacas de 60 kg, esse questionamento poderia ser formulado também desta forma: 16 de vida produzindo 100 sacas anuais ou 80 anos produzindo 20 sacas anuais?

Qual sua escolha?

Bem, daí começamos outra história…