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São Paulo

The Coffee Traveler by Ensei Neto

CIÊNCIA

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Cafés do Baturité: Da história e das variedades

Thiago Sousa

A história da cafeicultura no Maciço do Baturité tem um enredo particularmente interessante desde o seu princípio.

Se lembrarmos que o café chegou ao Brasil via o Pará, é razoável pensar que Estados mais próximos se tornassem rota de propagação dessa preciosa planta, principalmente se levarmos em conta as condições de deslocamento que existiam na época. (Tudo bem, sabemos que em alguns Estados as estradas ainda continuam tão ruins como fossem ainda do tempo do Brasil Imperial…)

Imagine, então, uma linha traçada por um gigantesco compasso centrado no Pará, mais precisamente em Belém, e com abertura até a cidade de  Fortaleza, onde fica o Maciço. Ao girar para o Sul, percebe-se que este pedaço de circunferência mal passa pelo Oeste da Bahia e norte de Goiás. Ou seja, fica muito claro que dessa linha até o Rio de Janeiro a distância é enorme!

Alguns levantamentos apontam que as primeiras sementes vieram da França diretamente para a Serra da Meruoca, já no Século XIX, o que faria supor que a variedade pudesse ser daIlha de Reunião: em outras palavras, o sempre veneradoBourbon. No entanto, outros asseguram que as primeiras plantas de café vieram do Pará diretamente para o Sitio Bagaço, que tivemos a oportunidade de visitar. Neste caso, seria muito mais provável que fosse a variedade Typica.

De qualquer forma, o microclima reinante no Maciço ajuda bastante a adaptação do cafeeiro a começar pela boa característica de solo que observamos. Por estar localizado muito próximo a linha do Equador (pouca mais de 4o Latitude Sul), o sol é impiedosamente escaldante, tornando-se necessária a adoção de sombreamento para a lavoura. Segundo registros, esta técnica foi adotada já nos primeiros plantios, porém descontinuada por volta de 1970 em razão da escolha de um modelo de cafeicultura intensiva, que requer maior uso de fertilizantes químicos. Ah, e detalhe: o plantio feito à pleno sol, contrariando, digamos, a sabedoria dos antigos cafeicultores.

Dez anos foram suficientes para que os produtores decidissem retomar o plantio sombreado, dado o estrago que os raios solares muito intensos fizeram e ainda faziam no que restou das lavouras de café sob insolação direta.

Visitamos duas propriedades: os Sítios Bem-Te-Vi eBagaço. O Bem-Te-Vi, do Sérgio Patrício, empresário dedica-se mais à pecuária leiteira, mas tem no café uma nova paixão. Como toda pessoa nova no ramo, sem qualquer tipo de amarras anteriores nem tradição, vem testando soluções diferentes da praticada na região como o uso da irrigação para socorrer nos momentos de seca inesperada, variedades modernas (Paraíso, fruto de pesquisa da EPAMIG) e adubação química. A lavoura está sombreada em sua maior parte e justamente a pequena área sem o conforto que as copas do ingazeiro podem oferecer, literalmente foi dizimada pela insolação. Mesmo assim, sua produtividade ainda é baixa em razão da pequena quantidade de plantas por área, muito abaixo do recomendável e, também,  pela distribuição pouco homogênea das árvores para o sombreamento.

Enquanto isso, no centenário Sítio Bagaço, hoje do poderoso Grupo Edson Queiroz, as lavouras estão quase sob uma pequena floresta de grande biodiversidade. A casa sede é grandiosa, reflexo de um tempo de riqueza experimentada durante o auge da cafeicultura no Baturité. Máquinas de benefício muito antigas, construídas em madeira, ainda estão em funcionamento no pequeno armazém daquele sítio.

Para nossa surpresa, ao entrar na lavoura sombreada por árvores centenárias,  encontramos plantas cujos frutos nos parecem muito mais próximos à variedade Typica, dado seu formato ovalado e longo.

Ver esses frutos atiçou minha imaginação e paladar!

Mas, ficou evidente que o café não é a cultura a quem eles, do Sítio Bagaço, dão a maior atenção. Talvez receba menos até que o chuchu, que estava em plena colheita.

Para boa parte dos produtores do Baturité, o sentimento que se tem é o de que produzir café é algo que beira o sacrifício.