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São Paulo

The Coffee Traveler by Ensei Neto

MERCADO

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Sobre sementes e grãos

Ensei Neto

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O final dos anos 1960 e o início dos 1970 são sempre lembrados como aqueles em que as grandes transformações no campo das idéias e conceitos aconteceram, mudando definitivamente a forma de vermos o mundo. Uma revolução cuja bandeira era formada pela dupla Paz & Amor e que recebeu o nome de Flower Power, foi a retórica adotada pelos jovens para fazer frente às guerras que se seguiam, sendo a Guerra do Vietnan a mais importante.
A moda que surgiu tinha um colorido especial, contemplando toda a gama do espectro visível, completo arco íris, com suas tonalidades mais vibrantes em cada peça de roupa, que tinham como referência linhas esvoaçantes e psicodélicas, sinalizando o desejo de liberdade que estava se estabelecendo na Europa com reflexos em nosso país.

Por aqui, a economia, como ciclicamente ainda acontece, passava por infindáveis soluços de pequenas alegrias seguidas de apertos perversamente longos. Eram tempos em que a dificuldade para se adquirir itens de consumo importados era grandiosa e tínhamos de nos contentar com versões locais, nem sempre com o mesmo padrão de refinamento e muito caras, de roupas, carros (o máximo eram os esportivos feitos em fibra de vidro!) e até prosaicos na época long plays ou discos. 

Foi um tempo em que cantores e grupos surgiram e fizeram muito sucesso com canções em inglês, entre eles Christian da dupla sertaneja Christian & Ralf. Isso reflete a forte tendência do nosso povo aceitar padrões importados, enquanto que artistas como Chico Buarque e Rita Lee eram os favoritos da chamada elite cultural.

Fazenda Divino Espírito Santo, Piatã, Chapada Diamantina, BA.

Fazenda Divino Espírito Santo, Piatã, Chapada Diamantina, BA.

 O café é uma cultura que foi introduzida em nosso país por volta de 1727, inicialmente pelo Norte e Nordeste devido à proximidade com o Caribe e o extremo norte da América do Sul, onde já era cultivado, e em 1890 assumiu o posto de maior produtor mundial, que mantém até os dias de hoje.
A cafeicultura no Brasil se expandiu impulsionado pelo mercado que experimentava crescimento explosivo somado à conhecida capacidade de produzir em grande escala, no típico modelo conhecido por plantation ou, cá entre nós, monocultura.

A produção de café em nosso país é feita em propriedades e estruturas de todo o tamanho, desde pequenos produtores com chácaras de menos de 1 hectare a operações que compreendem números astronômicos. Tecnologias avançadas já são empregadas, desde o monitoramento de atividades via drones, análises detalhadas por processadores nas chamadas “nuvens” e equipamentos nas lavouras que literalmente só faltam fazer chover.
Por outro lado, é o capricho nas etapas de produção é que leva aos melhores resultados que podem ser percebidos numa xícara de café.

O cafeeiro, como se sabe, é uma árvore perene e produz todos os anos. Suas frutas atendem um ciclo que é anual, ou seja, sua florada principal ocorre na primavera, dando sequência de crescimento dos frutos durante o verão até o amadurecimento no outono, quando inicia-se sua colheita. 
As frutas devem ser colhidas maduras, preferencialmente, uma vez que elas chegam a esse ponto somente se estiverem ligadas à árvore. É por esta razão que frutas colhidas imaturas contribuem para uma bebida de qualidade inferior porque a adstringência se torna predominante.

 A bebida café é produzida a partir das sementes torradas.

Então, por que será que praticamente todos os que trabalham com café utilizam a palavra “grão” para se dirigir à semente?

A palavra grão é empregada para sementes de gramíneas, como o trigo e o arroz, ou de leguminosas como a soja e a ervilha. A principal característica dessas plantas é que são todas de ciclo curto, entre 60 e 120 dias, sendo que ao final a planta morre de velhice...

São todas culturas de países de clima temperado e, por isso, que têm um período relativamente curto para esse trabalho. Em razão da crescente necessidade de mecanização e automação, praticamente todo as operações tendem a ser realizadas em um pequeno número de vezes, especialmente durante o plantio. Uma vez que as planta crescem, fica muito difícil entrar novamente nas lavouras para fazer tratamentos, a não ser que sejam empregados sistemas mais sofisticados como aviões e até drones, como vêm sendo testados hoje.

 É por isso que muitos dos agrotóxicos das empresas com sede no Hemisfério Norte são aplicados no solo e ficam ativos por até 90 dias, que é, coincidentemente, o tempo médio do ciclo das plantas que mencionei. Isso casa perfeitamente com a ideologia de que as sementes do cafeeiro sejam chamadas de “grãos”, mesmo, tecnicamente, não sendo!

Afinal, são sementes de uma fruta.

Tratar a lavoura de café como se fosse um campo de cereais ou leguminosas é fazer com que os cafeicultores se tornem menos atentos às sutis e dinâmicas mudanças que ocorrem nas plantas. Por mais que isso seja prática nos países da Europa e da América do Norte, faz pouco sentido no Brasil, de clima misto Equatorial e Tropical, a não ser que o modismo seja para se ter mais comodidade. Artesanato não é para os acomodados.

No momento em que o cafeicultor se conscientiza de que é um produtor de frutas e que seu campo na verdade é um pomar, seu relacionamento com as plantas se transforma. Por princípio, o produtor de frutas é dado às sutilezas e ao perfeccionismo.

Portanto, cafeicultores, olhem seus campos como belos pomares!

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Jam Café Uruguay: despertando uma paixão!

Ensei Neto

(E/D) Daniel Kondo, Nacho Gallo, Ensei Neto e Juan Pablo Imbellone

(E/D) Daniel Kondo, Nacho Gallo, Ensei Neto e Juan Pablo Imbellone

Nada acontece por acaso, nem mesmo as grandes paixões.
No início de 2015 iniciamos uma saga que rapidamente ganhou estrada e grandes dimensões por sua proposta inédita de educação do consumidor: o JamCafé Brasil.
Nascido como 1º Jamboree Café Brasil, a programação do evento tinha como referência as demandas  por temas eleitos pelos associados do Clube do Café (CDC) e naturalmente típicos para os coffee geeks e coffee lovers de plantão. Por essa característica, algumas empresas enxergaram no Jam Café Brasil, sediado em São Paulo e realizado na bela estrutura da Zwilling J. A. Henckels Brasil, uma plataforma para testar seus novos produtos: o primeiro Nitro Cold do Brasil (True Coffee Inc.), os porta filtros de porcelana alemães (Melitta), e as cachaças 1000 Montes (Destom Destilaria). 

Em seguida,  surgiu a oportunidade de levar a mesma programação para outras localidades como Porto Alegre, RS, e Brasília, DF, que receberam o nome "Sul" e "Centro Oeste", respectivamente. Esse mesmo formato, mais enxuto, agora tem o nome "On the Road".

Sucesso total! 

Dessa forma, a 4ª Edição, em São Paulo, ganhou força ao firmar parceria com a Universidade Anhembi Morumbi. Palestras e debates sobre as cafeterias de cada pedaço do Brasil (sim, donos de cafeteria do Nordeste ao Sul estiveram presentes!), além do tema principal sobre Torra do Café, incluindo uma deliciosa palestra com a pesquisadora Ana Rita Suassuna e a centenária torra do café do nordestino, e os workshops movimentaram as salas durante todo um final de semana.

Jamboree Brasil Café/Jam Café. Arte: Daniel Kondo.

Jamboree Brasil Café/Jam Café. Arte: Daniel Kondo.

Tornar o evento internacional foi parte de uma paixão que se despertou num uruguaio apaixonado por comida e bebida, além de organizar importantes eventos em seu país.
Juan Pablo Imbellone bebia café como uma bebida coloquial até que um amigo em comum nos apresentou e passou a se interessar mais. Descobriu um novo mundo ao experimentar alguns cafés especiais e, assim, para ter uma incontrolável paixão foi "un rato", como se diz no Uruguai.

Em 2017 realizou-se o 1º Jamboree Café Uruguay/Punta del Este, contando com toda a galera cafeínada e que teve como ponto alto a 1ª Competencia Barista de Uruguay. Diversos workshops de educação sensorial e cupping fizeram parte da programação, além do concorrido treinamento de Lattè Art com os baristas André Martinelli, do Brasil, e Daniel Calderón, da Argentina.
Foi emocionante e divertido!
E graças aos esforços de Juan Pablo e suas incríveis conexões, o evento foi um sucesso, unindo cafeterias, coffee lovers e baristas do Uruguai.

Sim, 2018 terá a 2ª Edição, agora como Jam Café Uruguay!

Como mostram as fotos do Jam Café Uruguay/On the Road 2018, que aconteceu no Nómade Café, Montevideo, e Circus Café, Punta del Este, promete ser um belo evento!

Da roça à caneca de café

Ensei Neto

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O mercado de café já faz um bom par de anos que pratica o modelo chamado de “from farm to cup” que poderia ser traduzido por “da roça à caneca”, que é um movimento que estabelece claramente o conceito de reconhecer a origem e conectar com o consumidor.

Produzir cafe não é tarefa simples!

A produção agrícola exige uma atenção e cuidado que absorvem muito o cafeicultor, que não pode dispensar o planejamento anual, que deve contemplar as diversas operações na lavoura ao longo do ano como a adubação, o monitoramento de doenças e pragas, por exemplo. Além de tudo, tem de fazer um contrato com São Pedro para que o clima não desande, nem pra muita chuva, nem pra sufocante seca.

Administrar tendo sócio o clima é desafio diário, porém que sempre traz muitas alegrias. Por outro lado, esse mesmo sócio pode criar situações limites, que estressam o cafeicultor, seja por uma temperatura devido ao sol quase impiedoso, seja por chuvas e ventos frios fora de hora.

Também pesa bastante na gestão o fato de que as despesas são diárias, atingindo picos durante a fase de colheita, mas com o faturamento realizado num período relativamente curto. É, por isso, que se diz em jargão de mercado, que o cafeicultor em geral trabalha sempre “alavancado financeiramente”, isto é, sendo obrigado a antecipar receitas para fazer frente os gastos do dia a dia, fazendo sua renda liquida diminuir sensivelmente.

Observe que comercializar o seu produto, o café cru, também não é tarefa fácil...

Exige elevado conhecimento de seu produto, o que é dominado por raros produtores, e que permite melhor margem de negociação com os compradores, em geral grandes empresas comerciais.

É, por isso, que empresas são formadas a partir de investidores com bom volume de capital para investir na compra de café cru de produtores que precisam vender de qualquer forma e, assim, poderem realizar ganhos expressivos. Se você observar atentamente, principalmente no atual mercado de cafés especiais, muitos comerciantes se travestem de produtores para ter maior acesso aos verdadeiros produtores, que apenas produzem. Nesse meio estão grandes empresas comerciais e novíssimos participantes entrando.

Uma das alternativas que diversos cafeicultores enxergaram foi o de trilhar pelo caminhos da industrialização de sua produção. Isso explica a explosão do mercado de torradores de café de pequeno porte no Brasil, que se observa em diversos países produtores, porém em muito menor escala.

Para o cafeicultor, torrar seu próprio café aparentemente lhe permite maior controle de seu produto e do seu negócio. No entanto, muitas vezes tardiamente, ele percebe que existe um conhecimento que é precioso e que ele não possui:  logística e distribuição.

Logística e distribuição é a chamada dupla dinâmica do comércio de varejo, mesmo para o atacadista, que pede alta especialização dos empreendedores. E haja dor para essas pessoas!

Produtores mais capitalizados e com capacidade administrativa, passaram a se arriscar em estágios ainda mais avançados da cadeia, que é o trato direto com o consumidor. Sim, estou comentando sobre as cafeterias.

Esse movimento, de lances mais sofisticados, se iniciou na virada dos anos 1990 para 2000, com a cafeteria Cafeeira, da Fazenda Ipanema, que era, então, dos grupos Gomes de Almeida Fernandes e J. Bozzano. A Fazenda Ipanema, que naquele momento experimentava uma profunda mudança administrativa, teve esse novo caminho desenhado pelo seu então novo executivo, o promissor e talentoso Washington Rodrigues. Foi essa operação que revelou, por exemplo, a barista Isabela Raposeiras.

Com o tempo e amadurecimento do mercado brasileiro, outras operações surgiram, sendo a mais emblemática a Suplicy Cafés Especiais, do cerebral Marco Suplicy, que fincou bandeira em 2003 nos Jardins, em São Paulo. Numa proposta ousada para a época, foi, sem dúvida, a grande inspiração a tantas outras casas com o conceito “Da Roça à Caneca de Café”.

Nos últimos tempos esse conceito se multiplicou não só nas capitais, mas, também, nas cidades do interior, principalmente nas que estão em regiões produtoras de café, como a Rigno, em Vitória da Conquista, BA, da família Rigno de Piatã, ou a Dulcerrado, em Patrocínio, MG, da cooperativa local.  

Certamente o projeto mais ousado de “De la Finca a la Taza” é o da Federación de Cafeteros de Colômbia, que fincou sua primeira loja Juan Valdez nos Estados Unidos em 2003. Pode ser um modelo interessante, mas seu problema é o de não poder mostrar quem são os produtores que forneceram cada lote de café, trunfo inegável das micro redes que têm seus produtores à frente da operação.

 

 

Toda forma de café vale a pena

Ensei Neto

Torrando amostras - Curso de Formação de Coffee Hunters.

Torrando amostras - Curso de Formação de Coffee Hunters.

Beber café é, antes de mais nada, um ato de prazer, um presente que nos damos para comemorar pequenas conquistas diárias ou para apaziguar o espírito quando algo nos azedou o resto do dia.
A bebida mais sociável do planeta, sempre um convite para uma breve confraternização na padoca da esquina ou num balcão entre mesas de escritório, é sempre sinônimo de pausa e relaxamento. E aí existe uma divertida contradição, pois beber café nos desperta, melhora nosso foco e a memória de curto prazo, tornando o aprendizado mais eficiente. 
OK, um relax esperto... 

É incrível o que uma xícara de café pode fazer por nós!
Independente de quanto você pagou por uma xícara de café, a experiência tem de ser boa!
Preço na cafeteria ou na padoca é detalhe, pois é formado por muitos itens perfeitamente mensuráveis e outros arbitrariamente impostos.

Assim sendo, temos de valorizar e respeitar todo trabalho feito ao longo dessa imensa cadeia produtiva, onde a bebida é resultado de um impressionante esforço coletivo. Muitas mãos contribuíram para que sua experiência ao beber o café fosse excelente: do produtor, desde a florada até o sagrado momento da colheita, passando pela secagem, torra das sementes e, finalmente, o serviço feito por um barista.

O consumo em casa vem ganhando contornos muito interessantes. Até um passado recente, preparar um café, seja num coador de pano ou numa cafeteira elétrica, era apenas a única atividade doméstica.
Depois surgiu o moedor doméstico, permitindo que o consumidor pudesse comprar café torrado em grãos e moer somente no momento do preparo. Isso foi um grande salto de qualidade, pois moagem fresca é, geralmente, garantia de maior frescor na bebida.

Tecnologia acessível para produtos domésticos provoca grandes mudanças no mercado consumidor porque amplia significativamente o número de pessoas que passam a se interessar por um determinado segmento.
Assim foi com a impressionante explosão de consumo de artigos para cozinha, de fogões de alto desempenho a fornos de convecção, passando por equipamentos versáteis como o Thermomix. Esse acesso permitiu que pessoas fizessem de sua cozinha o local mais importante da casa, retomando o reinado perdido para a sala e os equipamentos de home theater no final dos anos 1990.

Daí, foi um passo o movimento de fazer pães em casa. Levain, farinha de trigo de boa qualidade, amassadeiras e fornos se constituíram em temas dos novos padeiros!
A incrível dupla Cacau & Chocolate, antes reservada apenas às grandes indústrias, vem conhecendo uma legião crescente de fazedores de chocolate graças ao movimento Bean to Bar (“da amêndoa do cacau à barra de chocolate”)  que surgiu com o lançamento de máquinas de conchagem domésticas. 

A 4ª Onda do Café é, da mesma forma, a verticalização do processo de preparo do café a partir da torra das sementes dentro de casa. É um movimento crescente na América do Norte e que já chegou ao Brasil, sustentado pelos fazedores de café!
Um número crescente de empresas vêm lançando torradores domésticos, alguns com boa capacidade de controle do processo de torra, com preços bastante acessíveis.
Apesar de tudo, é incrível o número de pessoas que se utiliza do clássico torrador bola em casa, mesmo em território urbano. Os produtores rurais não abrem mão desse simples mas eficiente torrador, garantindo um belo café para todos os dias.

Por essa razão, durante a 4ª Edição do Jamboree Brasil Café uma das atividades mais esperadas foi o Desafio Mestre de Torra, onde cada desafiado tinha de torrar um café em torrador bola!
Foi simplesmente incrível o que se viu: mestres de torra que mantiveram controle da chama de forma rigorosa, observando as diferentes etapas da torra do café, além da alteração da rotação do torrador. Uma perfeita simulação do que um torrador industrial faz.

Existe diversas formas de torrar as sementes do café, bastando sensibilidade e conhecimento para que os resultados sejam excelentes.
Da mesma forma, novos métodos de preparo são lançados a todo momento, ampliando as possibilidades de exploração do sabor e aroma de cada lote de café. Todos são ótimos, bastando conhecer como trabalhar com cada um corretamente. Não existe o melhor, mas, sim, aquele com o qual você mais se identifica e, por isso, você elege como o predileto.

Melhor é status de momento e preferência.
Confie sempre em seus sentidos.
Se a experiência foi boa, siga em frente!
Afinal, toda forma de café vale a pena!