Contact Us

Use o formulário à direita para nos contactar.


São Paulo

The Coffee Traveler by Ensei Neto

MERCADO

Onde está a cápsula que estava aqui?

Ensei Uejo Neto

Espresso, Porta Filtro. Foto: Ensei Neto/Arquivo Pessoal.

O serviço de Espresso sempre exerceu um grande fascínio nas pessoas pela história que envolve cada xícara preparada. A Escola Italiana, que originou este serviço que ainda é símbolo das cafeterias, prega que um excelente espresso é resultado dos chamados 4M: Miscela (blend), Macinato (moagem), Macchina (máquina de espresso), e Mano (o barista e sua habilidade).

São exatos 7g de café moído para se obter uma bela xícara de 30 ml de espresso após 25s a 30s.
Essa rapidez na extração é devida à pressão de 9 bar (ou atmosferas, ou seja, 9 vezes a pressão atmosférica ao nível do mar), efetivamente fazendo uma contração do tempo.

A gigante suíça Nestlé criou suas cápsulas de café em 1976 como uma solução para pessoas que apreciam a bebida com o charme do espresso e gostariam de ter acesso a diferentes origens de forma muito prática.
Dessa forma, estabeleceu um novo segmento no mercado de café com sua hoje super importante divisão Nespresso, cujo principal mote sempre foi a de entregar experiências sensoriais marcantes e inesquecíveis.

Cápsula Nespresso. Foto: Ensei Neto/Arquivo Pessoal.

 

No início de setembro, a também suíça Migros Delica AG, que tem aliança com a Café Royal, lançou a impressionante CoffeeB ou Coffee Ball (Esfera de Café), que é utilizada em sistema similar ao de cápsula, porém sem a cápsula.

Parece confuso?

O time de pesquisa e inovação das duas empresas trabalhou para que fosse possível criar um produto que dispensasse qualquer tipo de invólucro que envolvesse manufatura industrial e, também, extraísse um café de excelente qualidade.
Trata-se de uma esfera de pó de café torrado compactado coberto por uma película protetora à oxidação, cujas especificações de blend ficam inscritas a laser, num resultado esteticamente minimalista e elegante.

 

Estão disponíveis diversos blends com diferentes intensidades de sabor, em escala equivalente à criada pela Nespresso, incluindo versão descafeinada, em sua maioria com as principais certificações de processos produtivos como Rainforest e Orgânico.

Para compor o conjunto, desenvolveu-se uma cafeteira de belo design, Globe, que extrai o café de acordo com a opção de volume selecionada. Ao final, a esfera de café torna-se pronta para ser utilizada, por exemplo, em jardins ou vasos como base de compostagem, solução perfeitamente ecológica.

 Por enquanto é vendida apenas na Suiça e França, tendo a Alemanha como o próximo país a comercializar tanto o CoffeeB quanto a cafeteira CoffeeB Globe, que custam a partir de U$4,60 e U$150, respectivamente.

 Isso posto, é demonstração que o mercado de café continua vigoroso e pleno de inovação.

Resta conferir o resultado sensorial e como será seu desempenho no mercado.

 

  

 

A Cafeicultura em tempos de climas extremos

Ensei Uejo Neto

Preparando o solo para plantio de café. Foto: Ensei Neto/Arquivo Pessoal.

Há um consenso de que o clima mudou, pois seus reflexos estão sendo percebidos e ainda compreendidos.
A vida em nosso planeta depende de um delicado equilíbrio que a Natureza sempre conduziu de forma impecável, mas que a ação humana vem provocando alterações de grande impacto.

Os princípios conceituais de produção e da qualidade de qualquer produto agrícola estão fortemente vinculados às condições climáticas, tendo nas floradas o seu ponto de partida.

Sabe-se que a indução dos botões florais e a floração, no caso dos cafeeiros, dependem de diversos fatores como a arquitetura da planta, do espaçamento empregado na lavoura e características genéticas entre outros. Hipoteticamente, vamos admitir que ocorra uma única florada.

 A florada e a consequente fecundação definem o potencial produtivo de uma lavoura. É a primeira expectativa que o produtor tem e que lhe permite fazer algumas contas preliminares sobre o que poderá ser seu faturamento ao final da safra.

Sabe-se que plantas de Coffea arabica tem 44 cromossomos, o que lhe dá, digamos, um ar mais esperto em relação as de Coffea canephora com seus 22 cromossomos.

Cafeeiros Mundo Novo, Bourbon e Catuaí se orgulham de não dependerem de terceiros pois são autopolinizantes, restando uma quantidade marginal que poderia eventualmente ser trabalhada por agentes externos. Os clones de Robusta e Conilon dependem da ajuda imprescindível das abelhas para que a polinização aconteça.

Se por um lado, o maior número de cromossomos das variedades do arabica lhe empresta uma suposta superioridade, é onde reside sua maior fragilidade, pois há um evidente processo de seleção até se chegar a um indivíduo com características de homozigoto.
A pureza genética pode ser tanto do bem quanto do mal.

O que dá aos canephoras maior capacidade de adaptação é justamente a necessidade de sua fecundação acontecer por polinização cruzada, aumentando exponencialmente a variabilidade das características de seus indivíduos.

 Só para lembrar: nosso universo tem como característica ser formado por indivíduos, daí ser tão importante o chamado “olhar estatístico” para tudo o que ocorre na Natureza. Não há necessidade de saber fazer os complicados cálculos, mas, apenas ter a compreensão do impacto de um evento em relação ao número de envolvidos.

 O pólen, que é responsável pela fecundação das flores, basicamente é constituído de proteínas, o que explica a necessidade de se dispensar extremo cuidado na sua conservação e em seu uso. Como as flores sempre ficam ao tempo, a intensidade de raios ultravioleta pode afetar a viabilidade do pólen.

Admitindo que nosso planeta é quase esférico, levemente abaulado, para melhor compreender a quantidade de luz num determinado local, criei este gráfico:

Luminosidade ao longo do ano para uma determinada latitude. Ensei Neto

Lembro que a latitude tem correlação direta com a quantidade de luz que um determinado local em nosso planeta pode receber ao longo do ano, levando em conta a variação devida ao deslocamento do eixo de rotação, que é de 23º27’.

Anos atrás, quando me iniciei no mercado de café ao trabalhar na fazenda do meu sogro, um fato que me chamava muito a atenção era a maior quantidade de grãos moca nos lotes produzidos naquela fazenda, na região de Paracatu-Unaí, MG, em relação aos do Triângulo Mineiro, principalmente Patrocínio. Comecei, então, a levantar os dados de diferentes regiões durante 8 anos e cheguei a este gráfico que apresenta a frequência de grãos moca em razão da latitude de produção.

Incidência de grãos moca de acordo com a latitude. Fonte: Ensei Neto.

Ficou claro que havia uma relação direta entre intensidade de raios ultravioleta com a maior quantidade de mocas nos lotes produzidos em fazendas localizadas nas regiões de menor latitude.
Os trópicos são linhas imaginárias que representam, digamos, uma expansão da linha do Equador devido à inclinação do eixo rotacional da Terra. Isso explica o porquê do Trópico de Capricórnio ter latitude de exatos 23º27’, que passa nos limites do município de São Paulo.

Localidades com maior proximidade à linha do Equador recebem uma carga de ultravioleta muito intensa porque sua incidência é praticamente perpendicular à Terra, sofrendo menos perdas ao atravessar a atmosfera. Esta é a razão da variação da quantidade de moca em diferentes latitudes.

Grão moca ou peaberry, torrado. Foto: Ensei Neto.

Apesar da glamurização e até gourmetização dos grãos moca, com diversas lendas rurais e urbanas, como a de que é um grão mais denso ou que absorveu os nutrientes de duas sementes, a verdade é que ele representa efetivamente uma perda real de produtividade, pois é resultado de fecundação de um único alojamento. De dois indivíduos potenciais, restou apenas um.

Outro efeito de fecundação defeituosa é a frequência do chamado grão mal formado, que nos países centroamericanos e na Colômbia recebe o nome de flotador, enquanto que compradores internacionais o denominam de floater, em inglês.
É um grão que apresenta estrutura débil, maior fragilidade da parede celulósica e menor capacidade de se tornar um indivíduo completo, o que pode ser inferido pela menor quantidade de açúcares e de ácido cítrico. Sua densidade é muito menor do que a de um grão saudável, o que leva a um impacto direto na produtividade da lavoura.

Grãos mal formados ou flutuadores (floaters). Foto: Ensei Neto.

A qualidade do café tem relação direta com a uniformidade de um lote, isto é, de como são os indivíduos que compõem esse conjunto. Quanto mais parecidas forem suas características, tanto mais homogêneo é o lote.

A partir da premissa que exista uma única florada, a uniformidade do lote será definida pela chamada “janela de fecundação” das flores, que estabelece a sincronia do ciclo fenológico ou ciclo de cada fruta. A distribuição espacial das flores numa roseta faz com que cada qual receba diferente carga de luz e consequente exposição ao calor, o que leva aos diferentes momentos de fecundação.

Janelas de fecundação curtas, como aquelas decorrentes de suficiente estresse hídrico, levam à maturação com alta uniformidade.

O que molda a geografia econômica do mundo são os grandes eventos climáticos.

O Brasil é o país produtor de café com a maior amplitude de latitude das suas origens, desde o Maciço do Baturité, Ceará, com 6º Latitude Sul, ao Paraná, com suas regiões subtropicais, isto é, maior que 23º27’ Latitude Sul.
Outro aspecto interessante da América do Sul, onde o Brasil ocupa praticamente toda a parte oriental e central, é o formato de triângulo com um dos vértices apontado para o Polo Sul, onde se originam poderosas massas polares que podem levar extremo frio às regiões cafeeiras.

Num passado recente, foram 2 as chamadas grandes geadas, a primeira ocorrida em 1975, que mudou o mapa cafeeiro do Brasil ao abrir uma nova região que se tornaria referência em tecnologia e produtividade: o Cerrado Mineiro.
Ao dizimar cafezais do Norte do Paraná, Alta Paulista, Noroeste e Sorocabana, em São Paulo, aquele evento fez com que cafeicultores dessas origens buscassem novos locais para plantio, longe do alcance das massas polares.

A segunda grande geada aconteceu em 1994, coincidindo com a implantação do Plano Real, que fez o país sair de um longo período de hiperinflação.
Esse evento de grande impacto destruiu mais de 90% do parque cafeeiro do Paraná, além causar grandes estragos na Alta Mogiana, Sul de Minas e na novata região do Cerrado Mineiro.
Uma nova reconfiguração do mercado aconteceu, desta vez com a emergência de um Tigre Asiático, o Vietnã e seus robustas. Para se ter idéia do crescimento de sua produção, em 1994 aquele país mal alcançou 250 mil sacas de 60kg, sendo hoje o segundo maior produtor mundial de café com mais de 30 milhões de sacas de 60kg.

A geada cria desdobramentos por pelo menos dois anos seguintes, tanto no campo das cotações e preços, com efeitos imediatos, como no desempenho das lavouras, resultados que são percebidos gradativamente.
O efeito mais perverso é o da seca prolongada após o intenso resfriamento, similar ao que o ar condicionado faz no ambiente. A estiagem que se segue tem na amplitude térmica exagerada sua maior marca.
O ar seco se constitui em barreira menor para a incidência dos raios ultravioletas, que chegam com maior intensidade à superfície da Terra.

Fenômenos climáticos que mais têm recebido atenção nos últimos anos é a dupla El Niño e La Niña, que ficaram conhecidos ainda na década de 1990. Quando atuam, modificam dramaticamente a distribuição de chuvas na América do Sul, com reflexos extremamente fortes no Brasil.
Neste estudo climático, foi feito um extrato das temperaturas em anos de La Niña, cujos resultados apresento a seguir.

Observe que existe uma regularidade na chegada das massas polares, com predominância de duas ondas. Após a ocorrência da segunda onda, a amplitude térmica se torna muito grande, ultrapassando 12ºC de diferença.

Em 2021, as duas ondas se confirmaram, talvez com maior intensidade pelo fato de ter ocorrido o fenômeno La Niña pelo terceiro ano consecutivo, algo inédito até então.
A estiagem que se seguiu foi uma das maiores já vistas em diversas partes do Brasil, principalmente na faixa onde se localiza a chamada “calha de convergência climática”, que tem origem na costa peruana e abrange Estados como Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Minas Gerais, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo e Paraná, que corresponde a uma área responsável por mais de 70% da produção agrícola brasileira.

O ar extremamente seco com altas temperaturas, reflexo da mínima barreira enfrentada pelos raios ultravioleta, levou a um efeito até então pouco visto: a perda da capacidade de fecundação das flores dos cafeeiros.
O pólen foi definitivamente afetado pelo calor extremo, desnaturando-se e, como resultado, levando a uma baixíssima taxa de fecundação em algumas regiões.
Um dos locais que esse fenômeno de clima extremo ocorreu em 2021 foi no Cerrado Mineiro, cuja análise está neste gráfico:

Temperatura e Fecundação. Fonte: Agrobee Tech.

Em algumas regiões, já estão sendo enviados aos armazéns os primeiros lotes  da atual safra e em boa parte deles está sendo observada uma quantidade muito acima do normal de grãos moca.

Isso representa uma irreparável quebra de produção.

O clima já se mostrou muito seco ainda em fins de junho, quando se esperava uma segunda onda de frio tão intensa quanto a que ocorreu em meados de maio. No entanto, o que se observou foi o gradativo aumento da amplitude térmica, que em meados de julho alcançou mais de 15ºC em diversas regiões cafeeiras.

Quais as estratégias que podem ser adotadas para minimizar o impacto desse cenário de clima extremo?

Como deve se reconfigurar o mercado de café, ante essas mudanças climáticas?

Existem algumas alternativas que têm se mostrado eficazes como a polinização assistida e o controle biológico de pragas e doenças, além de manejo conservacionista nos cafezais, que enfocarei em breve.

Ética e Futuro

Ensei Uejo Neto

O início das grandes mudanças na cadeia de comercialização dos produtos alimentícios foi o evento do Mal da Vaca Louca, no final dos anos 1990, que era uma doença que se disseminou na Europa em razão do consumo de carne de gado confinado e alimentado com os restos processados de seus próprios pares. 

Foi um choque para a imensa maioria dos consumidores saber que a carne contaminada era de um animal alimentado de partes de um outro que já havia se tornado bife. Essa comoção fez com que algumas redes de varejo se sentissem imediatamente à beira do precipício, porque para todo o consumidor, atribuir a responsabilidade em relação à qualidade do alimento comprado é do estabelecimento. 

A saída para isso seria criar um sistema onde o caminho feito pelo produto pudesse ser monitorado para saber quem e como produziu, quem transportou, como foi armazenado e, finalmente, quando ficou exposto na prateleira. Foram as bases para um sistema de certificação de produção e de rastreabilidade do produto.

Sistema de Rastreabilidade identificando produtor, Japão.

Sistema de Rastreabilidade identificando produtor, Japão.

Assim, diversos sistemas de certificação foram surgindo, cada um com um enfoque específico, mas todos seguindo uma mesma linha mestra: estabelecer parâmetros de processos, definir os procedimentos de execução e ter rastreabilidade. 

A introdução dos sistemas de certificação trouxe enorme transformação no campo, permitindo que produtores com maior capacidade de atualização técnica e administrativa alçassem voos mais altos. Por coincidência, nesse mesmo período o setor agrícola brasileiro ganhou grande relevância mundial em diversos segmentos como fruto do investimento em ativos intelectuais.

Produtor participante do Certiminas Café, Programa de Certificação de Minas Gerais.

Produtor participante do Certiminas Café, Programa de Certificação de Minas Gerais.

 O campo teve de aprender a preencher planilhas e reter dados de produção, algo simples e corriqueiro entre pessoas acostumadas a trabalhar com Excel, mas muito distante da realidade de muitos que mal sabiam assinar o próprio nome. A verdade é que o abismo entre uma elite de produtores altamente preparados e aqueles que mal conseguem explorar o potencial de um smartphone e seus aplicativos se aprofundou. Nestes tempos pandêmicos, elementos como o distanciamento social, o maior cuidado e atenção à saúde de todos os participantes de uma cadeia produtiva, têm promovido forte entrada de tecnologias de mínimo contato como drones, teleconferências, monitoramento de fertilidade do solo por meio remoto e muito mais.

A questão central é como diminuir essa distância, dando mais acesso aos “sem acesso” ou quase?

Esse tipo de capacitação, que em fundamento é um processo de educação, gradativamente vem sendo assumido pela iniciativa privada, num claro movimento preventivo de manutenção da cadeia produtiva. Os produtos agrícolas continuam como importantes ativos estratégicos do mercado.

Diversas empresas compreenderam a importância de exercer o papel de provedora de capacitação aos produtores que já trabalham em comunidades ou que possam vir a se organizar dessa forma. O grande desafio é saber qual o melhor modelo de treinamento e capacitação a ser oferecido.

Treinamento de torra de café em “bolinha”, Divinolândia, SP.

Treinamento de torra de café em “bolinha”, Divinolândia, SP.

A base científica é fundamental, porém deve ser transmitida por atividades nas quais esse conhecimento se torne simples e acessível em sua compreensão.

 Um dos casos que bem representa a preocupação em manter uma relação virtuosa com os produtores acontece na região de Divinolândia, pequena cidade vizinha a Poços de Caldas. A APROD – Associação de Produtores de Café de Divinolândia, por meio de um projeto desenhado por Ensei Neto Educação e que conta com o apoio e iniciativa da Dengo Chocolates

O projeto possui diferentes etapas e a primeira tem o foco em melhorar a gestão da qualidade dos cafés produzidos pelos associados em suas unidades tipicamente familiares. Em muitos casos as esposas são responsáveis por conduzir a secagem dos cafés nos terreiros, entre outras tarefas, que foi o ponto de partida para o projeto.
Foi feito treinamento para torrar café com refinamentos em seus clássicos torradores bola e, também, para fazer a degustação dos lotes produzidos em cada sítio com um conjunto muito simples de utensílios como o moedor manual de ferro fundido e um prático sistema de filtro de papel. Esse arranjo permite fazer uma excelente triagem dos lotes vindos do cafezal, facilitando a gestão da produção com foco na qualidade.

Treinamento para a Gestão de Qualidade nas propriedades dos associados da APROD, Divinolândia, SP.

Treinamento para a Gestão de Qualidade nas propriedades dos associados da APROD, Divinolândia, SP.

Sobre sementes e grãos

Ensei Neto

1900-Gotas.jpg

O final dos anos 1960 e o início dos 1970 são sempre lembrados como aqueles em que as grandes transformações no campo das idéias e conceitos aconteceram, mudando definitivamente a forma de vermos o mundo. Uma revolução cuja bandeira era formada pela dupla Paz & Amor e que recebeu o nome de Flower Power, foi a retórica adotada pelos jovens para fazer frente às guerras que se seguiam, sendo a Guerra do Vietnan a mais importante.
A moda que surgiu tinha um colorido especial, contemplando toda a gama do espectro visível, completo arco íris, com suas tonalidades mais vibrantes em cada peça de roupa, que tinham como referência linhas esvoaçantes e psicodélicas, sinalizando o desejo de liberdade que estava se estabelecendo na Europa com reflexos em nosso país.

Por aqui, a economia, como ciclicamente ainda acontece, passava por infindáveis soluços de pequenas alegrias seguidas de apertos perversamente longos. Eram tempos em que a dificuldade para se adquirir itens de consumo importados era grandiosa e tínhamos de nos contentar com versões locais, nem sempre com o mesmo padrão de refinamento e muito caras, de roupas, carros (o máximo eram os esportivos feitos em fibra de vidro!) e até prosaicos na época long plays ou discos. 

Foi um tempo em que cantores e grupos surgiram e fizeram muito sucesso com canções em inglês, entre eles Christian da dupla sertaneja Christian & Ralf. Isso reflete a forte tendência do nosso povo aceitar padrões importados, enquanto que artistas como Chico Buarque e Rita Lee eram os favoritos da chamada elite cultural.

Fazenda Divino Espírito Santo, Piatã, Chapada Diamantina, BA.

Fazenda Divino Espírito Santo, Piatã, Chapada Diamantina, BA.

 O café é uma cultura que foi introduzida em nosso país por volta de 1727, inicialmente pelo Norte e Nordeste devido à proximidade com o Caribe e o extremo norte da América do Sul, onde já era cultivado, e em 1890 assumiu o posto de maior produtor mundial, que mantém até os dias de hoje.
A cafeicultura no Brasil se expandiu impulsionado pelo mercado que experimentava crescimento explosivo somado à conhecida capacidade de produzir em grande escala, no típico modelo conhecido por plantation ou, cá entre nós, monocultura.

A produção de café em nosso país é feita em propriedades e estruturas de todo o tamanho, desde pequenos produtores com chácaras de menos de 1 hectare a operações que compreendem números astronômicos. Tecnologias avançadas já são empregadas, desde o monitoramento de atividades via drones, análises detalhadas por processadores nas chamadas “nuvens” e equipamentos nas lavouras que literalmente só faltam fazer chover.
Por outro lado, é o capricho nas etapas de produção é que leva aos melhores resultados que podem ser percebidos numa xícara de café.

O cafeeiro, como se sabe, é uma árvore perene e produz todos os anos. Suas frutas atendem um ciclo que é anual, ou seja, sua florada principal ocorre na primavera, dando sequência de crescimento dos frutos durante o verão até o amadurecimento no outono, quando inicia-se sua colheita. 
As frutas devem ser colhidas maduras, preferencialmente, uma vez que elas chegam a esse ponto somente se estiverem ligadas à árvore. É por esta razão que frutas colhidas imaturas contribuem para uma bebida de qualidade inferior porque a adstringência se torna predominante.

 A bebida café é produzida a partir das sementes torradas.

Então, por que será que praticamente todos os que trabalham com café utilizam a palavra “grão” para se dirigir à semente?

A palavra grão é empregada para sementes de gramíneas, como o trigo e o arroz, ou de leguminosas como a soja e a ervilha. A principal característica dessas plantas é que são todas de ciclo curto, entre 60 e 120 dias, sendo que ao final a planta morre de velhice...

São todas culturas de países de clima temperado e, por isso, que têm um período relativamente curto para esse trabalho. Em razão da crescente necessidade de mecanização e automação, praticamente todo as operações tendem a ser realizadas em um pequeno número de vezes, especialmente durante o plantio. Uma vez que as planta crescem, fica muito difícil entrar novamente nas lavouras para fazer tratamentos, a não ser que sejam empregados sistemas mais sofisticados como aviões e até drones, como vêm sendo testados hoje.

 É por isso que muitos dos agrotóxicos das empresas com sede no Hemisfério Norte são aplicados no solo e ficam ativos por até 90 dias, que é, coincidentemente, o tempo médio do ciclo das plantas que mencionei. Isso casa perfeitamente com a ideologia de que as sementes do cafeeiro sejam chamadas de “grãos”, mesmo, tecnicamente, não sendo!

Afinal, são sementes de uma fruta.

Tratar a lavoura de café como se fosse um campo de cereais ou leguminosas é fazer com que os cafeicultores se tornem menos atentos às sutis e dinâmicas mudanças que ocorrem nas plantas. Por mais que isso seja prática nos países da Europa e da América do Norte, faz pouco sentido no Brasil, de clima misto Equatorial e Tropical, a não ser que o modismo seja para se ter mais comodidade. Artesanato não é para os acomodados.

No momento em que o cafeicultor se conscientiza de que é um produtor de frutas e que seu campo na verdade é um pomar, seu relacionamento com as plantas se transforma. Por princípio, o produtor de frutas é dado às sutilezas e ao perfeccionismo.

Portanto, cafeicultores, olhem seus campos como belos pomares!

IMG_1298.jpg

Robustas, os incompreendidos

Ensei Neto

Variedades clonais de conilon/INCAPER Norte, Linhares, ES.

Variedades clonais de conilon/INCAPER Norte, Linhares, ES.

Um dos principais motivos para levar um produto ou serviço à rejeição e, por vezes, ao esquecimento é quando seu conceito é mal comunicado. A incompreensão de atributos ou de características de um produto tem como resultado freqüente o uso incorreto que, enfim, molda a percepção de que se trata de algo que não é bom.

Cafés da espécie Coffea canephora, cujas variedades mais conhecidas por aqui são o Conilon e o Robusta, sempre foram considerados produtos de segunda categoria no mercado, sendo seu uso reservado aos cafés comerciais de baixa qualidade ou que requerem matéria prima essencialmente barata, como os solúveis.

Ao se classificar as bebidas do café, são dois os aspectos avaliados: as características físicas do lote e seu perfil sensorial. 
As características físicas estão correlacionadas com a qualidade decorrente da seleção das sementes, que preferencialmente devem ser de frutas colhidas maduras, isentas de apodrecidas, acometidas por fermentações indesejadas, verdes ou de contaminações como terra. Também, sementes mal formadas ou quebradas penalizam sua qualificação. 
Uma boa inspeção visual é o que basta!
Pureza é isso. 
E para um lote ser considerado consistente, há que existir uniformidade ou, tecnicamente, consistência estatística.

Já o perfil sensorial pode ser compreendido como o resultado da influência de três elementos: território, local onde está a lavoura, processo de secagem e processo de torra.

Desde os primórdios do café, quando seu consumo ainda era restrito ao leste africano e Península Arábica, variedades do Coffea arabica estiveram associadas a produto que proporcionava uma excelente experiência sensorial e uma sensação de bem estar promovida pela cafeína. As variedades do Robusta, encontradas inicialmente em áreas do atual Congo, sempre estiveram à margem do mercado, cujas sementes eram consideradas um produto secundário. 

A introdução de robustas no Vietnã, no início dos anos 1990, foi decisiva para a mudança de cenário do mercado cafeeiro. Após a grande geada de 1994 no Brasil, quando os preços do café alcançaram preços da ordem de US$ 300/saca de 60kg, o governo vietnamita considerou como oportunidade única expandir rapidamente a cafeicultura por meio de generoso financiamento aos produtores. Hoje, o Vietnã é o segundo maior produtor mundial de café, apesar de exclusivamente robusta, com mais de 30 milhões de sacas de 60kg. 
O impressionante salto de produção dos robustas reside no fato de se destinar preferencialmente à elaboração de blends competitivos em todo o mundo, com destaque para os países europeus como Portugal, Espanha e Itália, onde o espresso é um importante serviço nas cafeterias e restaurantes.

1902-robusta_6.jpg

No Brasil, devido à necessidade de matéria prima por parte da indústria de café solúvel e da mudança de patamar de preços dos arábicas, a produção de robusta, representado pela variedade Conilon, experimentou grande crescimento de produção, seja por meio de novas áreas na Amazônia, ou por incorporação de muita tecnologia no Espírito Santo. Da produção de Cafés do Brasil, nos últimos tempos o Conilon têm respondido por aproximadamente 1/3 do total. 
Devido à pressão de custos industriais, na segunda metade dos anos 2.000 iniciou-se em nosso país o emprego de Conilon em maiores proporções nos blends de produtos mais competitivos pelas empresas líderes de mercado. Até então, era usual se utilizar em torno de 10% a 15% dessa espécie na composição, observando-se olímpico salto para 40% e até 50%!

Historicamente, a qualidade sempre foi um desafio na produção de cafés em nosso país e no mundo. Desde o final do período do Império, já havia consciência da necessidade de se agregar valor por meio da qualidade da bebida. 
Um excelente documentário, “O Vale”, produzido pelo jornalista Marcos de Sá Correa e que foi ao ar no ano 2.000, fez um levantamento da cafeicultura do Vale do Parnaíba, apresentando descendentes dos barões e viscondes do café, cuja decadência se deu pela não observância de princípios de uma produção sustentável e voltada para a qualidade. É contundente, por vezes deprimente, pois mescla belas imagens com depoimentos de alto impacto. 

                                                                         

Um dos aspectos mais interessantes e até intrigantes do Conilon brasileiro é como sua bebida chega a ser descrita em diversas publicações: verde característico, gosto de madeira ou pipoca.
Quando se analisa com maior cuidado essas descrições, fica claro que existe um grave problema de cuidado na colheita. Da mesma forma que as frutas do cafeeiro da espécie arábica como um Mundo Novo, também no caso do Conilon colher sua fruta madura faz parte das regras para se obter uma bebida de alta qualidade. De fato, a questão crucial é que se colhe a maior parte da safra do conilon quando as frutas ainda estão verdes. 
Se sua colheita, em boa parte, é feita sem critérios de qualidade, na secagem não é diferente. Para tentar fazer vendas o mais rapidamente, os produtores empregam secadores com fogo direto, que fazem com que o fogaréu esfumaçante fique em contato com as frutas, que absorvem o gosto de fumaça. 

Como toda fruta, a do conilon também merece um tratamento digno para se obter uma bebida de qualidade, a começar pela colheita. Frutas maduras têm açúcar e acidez, tal qual como já tive oportunidade de provar cafés de robustas africanos de altitude, cujas bebidas eram excepcionais. Portanto, ter o entendimento de que se deve colher frutas maduras para se obter cafés conilon de alta qualidade é fundamental.
A secagem, por lógica, deve também ser feita de forma cuidadosa, em ritmo adequado, para que a sempre delicada semente não morra antes do tempo.
A torra do conilon e, dos robustas em geral, é outro ponto crítico. 
Há um pensamento comum de que sua torra deve ser sempre intensa, pois demora a fazer o  “crack”, segundo afirma a esmagadora maioria de mestres de torra que trabalham com essa semente. Na realidade, há que se compreender a composição química do conilon, que é o ponto de partida para se fazer um correto planejamento de torra, tal como deve ser para qualquer semente de café.

Considerando-se os três grupos de substâncias mais importantes, açúcares, gorduras e compostos clorogênicos ou família da cafeína, robustas têm metade do teor de açúcares em relação aos arábicas, enquanto que o dobro de gorduras e de cafeína & cia. A partir desta preciosa informação, pode-se concluir que com menor quantidade de açúcares redutores disponíveis, é mais difícil de se atingir o patamar de energia necessária para que ocorra a reação de pirólise em larga escala. Ou seja, há que se incorporar maior energia ao sistema. 
Uma torra feita com excelente domínio técnico conserva boa parte dos açúcares, o que garante a dignidade sensorial da bebida, preservando aromas e sabores originalmente desenvolvidos na fase viva da semente, além da construção de outros.

1501-+sal+3.jpg

Finalmente, outro ponto incompreendido é o relativo à extração da bebida. Apesar de se contar com matéria prima excelente, isto é, com frutas colhidas maduras e secagem bem conduzida, que se soma a um processo de torra inteligente, pode ocorrer ainda pecados que impedem de se obter uma bebida de alta qualidade. 
Certamente, o equívoco mais comum é o fato de não se compreender a composição química das sementes dos robustas e, por tabela, do conilon. É necessário, ainda, ter em conta como funciona o processo de percolação, uma vez que é o processo comum aos métodos de extração mais utilizados, como o Espresso, Hario, Melitta, Chemex e Kalita. 
Ao se combinar essas informações, chega-se à conclusão que a origem de boa parte da rejeição aos robustas está na concentração ou, como alguns preferem dizer, na proporção usada. Como nossa percepção para o sabor amargo é 15 vezes maior do que para o sabor ácido, por exemplo, é fundamental saber manejar sabiamente a concentração no preparo da bebida. Ou seja, com o conilon ou robusta 100%, a bebida fica com melhor percepção de seus atributos adocicados e ácidos se forem preparados a 5,5% m/v (equivalente a aproximadamente 1:18) contra os 7,0% m/v (ou, aproximadamente, 1:14), que hoje é bastante comum para os arábicas de excelente qualidade. 

Isso tudo demonstra que há um uma galáxia inteira a ser desbravada no universo cafeinado…

Jam Café Uruguay: despertando uma paixão!

Ensei Neto

(E/D) Daniel Kondo, Nacho Gallo, Ensei Neto e Juan Pablo Imbellone

(E/D) Daniel Kondo, Nacho Gallo, Ensei Neto e Juan Pablo Imbellone

Nada acontece por acaso, nem mesmo as grandes paixões.
No início de 2015 iniciamos uma saga que rapidamente ganhou estrada e grandes dimensões por sua proposta inédita de educação do consumidor: o JamCafé Brasil.
Nascido como 1º Jamboree Café Brasil, a programação do evento tinha como referência as demandas  por temas eleitos pelos associados do Clube do Café (CDC) e naturalmente típicos para os coffee geeks e coffee lovers de plantão. Por essa característica, algumas empresas enxergaram no Jam Café Brasil, sediado em São Paulo e realizado na bela estrutura da Zwilling J. A. Henckels Brasil, uma plataforma para testar seus novos produtos: o primeiro Nitro Cold do Brasil (True Coffee Inc.), os porta filtros de porcelana alemães (Melitta), e as cachaças 1000 Montes (Destom Destilaria). 

Em seguida,  surgiu a oportunidade de levar a mesma programação para outras localidades como Porto Alegre, RS, e Brasília, DF, que receberam o nome "Sul" e "Centro Oeste", respectivamente. Esse mesmo formato, mais enxuto, agora tem o nome "On the Road".

Sucesso total! 

Dessa forma, a 4ª Edição, em São Paulo, ganhou força ao firmar parceria com a Universidade Anhembi Morumbi. Palestras e debates sobre as cafeterias de cada pedaço do Brasil (sim, donos de cafeteria do Nordeste ao Sul estiveram presentes!), além do tema principal sobre Torra do Café, incluindo uma deliciosa palestra com a pesquisadora Ana Rita Suassuna e a centenária torra do café do nordestino, e os workshops movimentaram as salas durante todo um final de semana.

Jamboree Brasil Café/Jam Café. Arte: Daniel Kondo.

Jamboree Brasil Café/Jam Café. Arte: Daniel Kondo.

Tornar o evento internacional foi parte de uma paixão que se despertou num uruguaio apaixonado por comida e bebida, além de organizar importantes eventos em seu país.
Juan Pablo Imbellone bebia café como uma bebida coloquial até que um amigo em comum nos apresentou e passou a se interessar mais. Descobriu um novo mundo ao experimentar alguns cafés especiais e, assim, para ter uma incontrolável paixão foi "un rato", como se diz no Uruguai.

Em 2017 realizou-se o 1º Jamboree Café Uruguay/Punta del Este, contando com toda a galera cafeínada e que teve como ponto alto a 1ª Competencia Barista de Uruguay. Diversos workshops de educação sensorial e cupping fizeram parte da programação, além do concorrido treinamento de Lattè Art com os baristas André Martinelli, do Brasil, e Daniel Calderón, da Argentina.
Foi emocionante e divertido!
E graças aos esforços de Juan Pablo e suas incríveis conexões, o evento foi um sucesso, unindo cafeterias, coffee lovers e baristas do Uruguai.

Sim, 2018 terá a 2ª Edição, agora como Jam Café Uruguay!

Como mostram as fotos do Jam Café Uruguay/On the Road 2018, que aconteceu no Nómade Café, Montevideo, e Circus Café, Punta del Este, promete ser um belo evento!

Specialty é a nova Commodity

Ensei Neto

IMG_7067.jpg

Tenho o privilégio de ter como grande amigo de longa data o José Carlos Spinelli, químico de formação e paixão. Quando o conheci, na época que Donna Summer e a Disco Music eram o coquetel molotov que agitavam as noites paulistanas, Zé Carlos trabalhava na filial brasileira da então legendária R. O. Hull Co. ou simplesmente Rohco, cuja sede era em Ohio. 
O fundador dessa empresa, Mr. Hull, foi o criador da emblemática Célula de Hull, muito empregada em laboratórios de galvanoplastia ou ciência do tratamento de superfícies, fundamental, por exemplo, na preparação de pintura em veículos nas montadoras em geral. 

Zé Carlos sempre foi um pesquisador nato, inspiradíssimo, chegando a desenvolver diversas patentes para as empresas em que trabalhou. Por esse espírito inquieto, fez a empresa crescer, chegando a ocupar alta posição no comitê internacional. Uma de suas frases mais frequentes era "a Rohco é pequena, mas tenho certeza que se tornará grandiosa porque seus fundamentos e produtos são muito bons." 
Um de seus presentes mais simbólicos foi uma pequena esfera de vidro que tinha os continentes jateados, que ao me entregar disse uma frase marcante: "este é o território que temos de conquistar!" 
Uau! O mundo é o limite!

Em tudo na Natureza, que se reflete no mercado, há uma lógica muito interessante: movimentos ou negócios que são geniais em sua concepção rapidamente crescem, muitas vezes contra as estruturas dominantes, em processo chamado de Contracultura. 
Contracultura representa rebeldia, até uma certa romântica beligerância em sua forma de atuar durante o seu crescimento, extremamente próximo do espírito adolescente. E todas as vezes que existe uma tentativa de ser diminuído ou até barrado, replica com maior vigor.
Porém, depois da adolescência, assim como o ser humano entra na maturidade, depois de experimentar a consolidação de seus negócios e objetivos, os movimentos ou as instituições   passam a buscar posição estável e confortável, sem querer perder a liderança. 

O mercado dos Cafés Especiais ou simplesmente Specialty Coffee completa quase 35 anos desde que foi configurado pelo incrível Grupo de San Francisco, que fundou a então SCAA - Specialty Coffee Association of America, fundamental ao estimular a aproximação entre os cafeicultores e as então inovadoras cafeterias. Essa transparência entre as pontas do mercado é que caracteriza a 3ª Onda do Café.

No início dos anos 2000, cafeterias inovadoras e cheias de ideais de transformação do mundo através de transparência no comércio de café, apresentando os produtores como verdadeiros artistas e modelo arejado de negócios tinham como suas principais representantes a Intelligentsia, de Doug Zell e Geof Watts, em Chicago, a Stumptown, de Duane Sorensen, em Portland, e Victrola, em Seattle. Na inauguração de sua terceira loja, a Stumptown Downton, um serviço de vinhos passou a ser oferecido, numa antevisão do que poderia ser um cardápio mais eclético nas cafeterias.

O crescimento dessas inspiradas empresas foi vertiginoso, expandindo suas operações por outras grandes cidades e despertando a atenção das gigantescas empresas.
Recentemente, numa tacada só, a gigantesca JDE - Jacobs Dowe Egberts tornou-se dona da irreverente Stumptown, da então radical Green Mountain, de Vermont, e da descolada Peet's. Para não ficar atrás, a suíça Nestlé adquiriu a Blue Bottle com valores que surpreendeu o mercado. Chegou o momento desses rapazes de outrora desfrutarem dos louros da fama e fortuna, exatamente como é o "American Dream": iniciar algo criativo, crescer, despertar o interesse e ter o negócio vendido por um excelente valor para, daí, desfrutar a vida.
Estas últimas compras chegaram a abalar a fé dos puristas e idealistas do café de relacionamento, base conceitual do Specialty Coffee. No entanto, aquelas operações já estavam grande o suficiente para deixarem de ser consideradas como irreverentes. 

Outro movimento que identifica a mudança do mercado de especiais é o modelo de comércio do café cru a partir de suas origens. No início dos anos 2.000, as principais casas de comércio internacional criaram braços para atuarem no segmento dos cafés especiais, como a Cape Horn, do Grupo Tristão, e a Volcafe Specialty, da germânica Volcafe. O que diferenciava esses braços da operação da casa matriz era o modelo de financiamento de seus clientes na aquisição dos lotes adquiridos em diversos países.

Uma das grandes casas, que hoje assumiu com folga a liderança mundial nesse segmento, foi a empresa da família Esteves. Sua inteligente estratégia consistiu na aquisição de empresas que estavam se especializando no mercado, mantendo seus donos originais como executivos com a finalidade de demonstrar que nada havia mudado...
No Brasil, fazem parte de seu rico portfólio de braços de cafés especiais a Bourbon Coffees, de Poços de Caldas, a Carmo Coffees, de Carmo de Minas, e, mais recentemente, a Capricórnio Coffees, de Jacarezinho. Essas empresas atuam como a casa matriz, por exemplo, adquirindo cafés de outras origens que não as de sua localidade, como foi em sua fundação.

Nos últimos dias, uma notícia extremamente relevante abalou muitas pessoas ativistas dos cafés especiais: a decisão da Spruge, importante empresa de mídia e notícias, de renunciar à posição de Media Partner da SCA/World Coffee Events, que organizam as competições mundiais de baristas, por exemplo. 

Você pode saber mais através deste link: http://sprudge.com/sprudge-resigns-sca-media-partners-127965.html.

Com mais de 35 anos de estrada, a SCA, que surgiu da absorção da SCAEurope pela SCAAmerica, optou pela realização financeira em detrimento da essência e ideais que permearam sua fundação. Como maior organização comercial do mundo do café, segue agora o caminho típico de quem é Mainstream.

No entanto, o mercado é dinâmico e como na Natureza, em breve movimentos rebeldes e irreverentes irão surgir para surpreender.

Será a nova Contracultura!

 

  

 

 

Da roça à caneca de café

Ensei Neto

IMG_1552.JPG

O mercado de café já faz um bom par de anos que pratica o modelo chamado de “from farm to cup” que poderia ser traduzido por “da roça à caneca”, que é um movimento que estabelece claramente o conceito de reconhecer a origem e conectar com o consumidor.

Produzir cafe não é tarefa simples!

A produção agrícola exige uma atenção e cuidado que absorvem muito o cafeicultor, que não pode dispensar o planejamento anual, que deve contemplar as diversas operações na lavoura ao longo do ano como a adubação, o monitoramento de doenças e pragas, por exemplo. Além de tudo, tem de fazer um contrato com São Pedro para que o clima não desande, nem pra muita chuva, nem pra sufocante seca.

Administrar tendo sócio o clima é desafio diário, porém que sempre traz muitas alegrias. Por outro lado, esse mesmo sócio pode criar situações limites, que estressam o cafeicultor, seja por uma temperatura devido ao sol quase impiedoso, seja por chuvas e ventos frios fora de hora.

Também pesa bastante na gestão o fato de que as despesas são diárias, atingindo picos durante a fase de colheita, mas com o faturamento realizado num período relativamente curto. É, por isso, que se diz em jargão de mercado, que o cafeicultor em geral trabalha sempre “alavancado financeiramente”, isto é, sendo obrigado a antecipar receitas para fazer frente os gastos do dia a dia, fazendo sua renda liquida diminuir sensivelmente.

Observe que comercializar o seu produto, o café cru, também não é tarefa fácil...

Exige elevado conhecimento de seu produto, o que é dominado por raros produtores, e que permite melhor margem de negociação com os compradores, em geral grandes empresas comerciais.

É, por isso, que empresas são formadas a partir de investidores com bom volume de capital para investir na compra de café cru de produtores que precisam vender de qualquer forma e, assim, poderem realizar ganhos expressivos. Se você observar atentamente, principalmente no atual mercado de cafés especiais, muitos comerciantes se travestem de produtores para ter maior acesso aos verdadeiros produtores, que apenas produzem. Nesse meio estão grandes empresas comerciais e novíssimos participantes entrando.

Uma das alternativas que diversos cafeicultores enxergaram foi o de trilhar pelo caminhos da industrialização de sua produção. Isso explica a explosão do mercado de torradores de café de pequeno porte no Brasil, que se observa em diversos países produtores, porém em muito menor escala.

Para o cafeicultor, torrar seu próprio café aparentemente lhe permite maior controle de seu produto e do seu negócio. No entanto, muitas vezes tardiamente, ele percebe que existe um conhecimento que é precioso e que ele não possui:  logística e distribuição.

Logística e distribuição é a chamada dupla dinâmica do comércio de varejo, mesmo para o atacadista, que pede alta especialização dos empreendedores. E haja dor para essas pessoas!

Produtores mais capitalizados e com capacidade administrativa, passaram a se arriscar em estágios ainda mais avançados da cadeia, que é o trato direto com o consumidor. Sim, estou comentando sobre as cafeterias.

Esse movimento, de lances mais sofisticados, se iniciou na virada dos anos 1990 para 2000, com a cafeteria Cafeeira, da Fazenda Ipanema, que era, então, dos grupos Gomes de Almeida Fernandes e J. Bozzano. A Fazenda Ipanema, que naquele momento experimentava uma profunda mudança administrativa, teve esse novo caminho desenhado pelo seu então novo executivo, o promissor e talentoso Washington Rodrigues. Foi essa operação que revelou, por exemplo, a barista Isabela Raposeiras.

Com o tempo e amadurecimento do mercado brasileiro, outras operações surgiram, sendo a mais emblemática a Suplicy Cafés Especiais, do cerebral Marco Suplicy, que fincou bandeira em 2003 nos Jardins, em São Paulo. Numa proposta ousada para a época, foi, sem dúvida, a grande inspiração a tantas outras casas com o conceito “Da Roça à Caneca de Café”.

Nos últimos tempos esse conceito se multiplicou não só nas capitais, mas, também, nas cidades do interior, principalmente nas que estão em regiões produtoras de café, como a Rigno, em Vitória da Conquista, BA, da família Rigno de Piatã, ou a Dulcerrado, em Patrocínio, MG, da cooperativa local.  

Certamente o projeto mais ousado de “De la Finca a la Taza” é o da Federación de Cafeteros de Colômbia, que fincou sua primeira loja Juan Valdez nos Estados Unidos em 2003. Pode ser um modelo interessante, mas seu problema é o de não poder mostrar quem são os produtores que forneceram cada lote de café, trunfo inegável das micro redes que têm seus produtores à frente da operação.

 

 

Toda forma de café vale a pena

Ensei Neto

Torrando amostras - Curso de Formação de Coffee Hunters.

Torrando amostras - Curso de Formação de Coffee Hunters.

Beber café é, antes de mais nada, um ato de prazer, um presente que nos damos para comemorar pequenas conquistas diárias ou para apaziguar o espírito quando algo nos azedou o resto do dia.
A bebida mais sociável do planeta, sempre um convite para uma breve confraternização na padoca da esquina ou num balcão entre mesas de escritório, é sempre sinônimo de pausa e relaxamento. E aí existe uma divertida contradição, pois beber café nos desperta, melhora nosso foco e a memória de curto prazo, tornando o aprendizado mais eficiente. 
OK, um relax esperto... 

É incrível o que uma xícara de café pode fazer por nós!
Independente de quanto você pagou por uma xícara de café, a experiência tem de ser boa!
Preço na cafeteria ou na padoca é detalhe, pois é formado por muitos itens perfeitamente mensuráveis e outros arbitrariamente impostos.

Assim sendo, temos de valorizar e respeitar todo trabalho feito ao longo dessa imensa cadeia produtiva, onde a bebida é resultado de um impressionante esforço coletivo. Muitas mãos contribuíram para que sua experiência ao beber o café fosse excelente: do produtor, desde a florada até o sagrado momento da colheita, passando pela secagem, torra das sementes e, finalmente, o serviço feito por um barista.

O consumo em casa vem ganhando contornos muito interessantes. Até um passado recente, preparar um café, seja num coador de pano ou numa cafeteira elétrica, era apenas a única atividade doméstica.
Depois surgiu o moedor doméstico, permitindo que o consumidor pudesse comprar café torrado em grãos e moer somente no momento do preparo. Isso foi um grande salto de qualidade, pois moagem fresca é, geralmente, garantia de maior frescor na bebida.

Tecnologia acessível para produtos domésticos provoca grandes mudanças no mercado consumidor porque amplia significativamente o número de pessoas que passam a se interessar por um determinado segmento.
Assim foi com a impressionante explosão de consumo de artigos para cozinha, de fogões de alto desempenho a fornos de convecção, passando por equipamentos versáteis como o Thermomix. Esse acesso permitiu que pessoas fizessem de sua cozinha o local mais importante da casa, retomando o reinado perdido para a sala e os equipamentos de home theater no final dos anos 1990.

Daí, foi um passo o movimento de fazer pães em casa. Levain, farinha de trigo de boa qualidade, amassadeiras e fornos se constituíram em temas dos novos padeiros!
A incrível dupla Cacau & Chocolate, antes reservada apenas às grandes indústrias, vem conhecendo uma legião crescente de fazedores de chocolate graças ao movimento Bean to Bar (“da amêndoa do cacau à barra de chocolate”)  que surgiu com o lançamento de máquinas de conchagem domésticas. 

A 4ª Onda do Café é, da mesma forma, a verticalização do processo de preparo do café a partir da torra das sementes dentro de casa. É um movimento crescente na América do Norte e que já chegou ao Brasil, sustentado pelos fazedores de café!
Um número crescente de empresas vêm lançando torradores domésticos, alguns com boa capacidade de controle do processo de torra, com preços bastante acessíveis.
Apesar de tudo, é incrível o número de pessoas que se utiliza do clássico torrador bola em casa, mesmo em território urbano. Os produtores rurais não abrem mão desse simples mas eficiente torrador, garantindo um belo café para todos os dias.

Por essa razão, durante a 4ª Edição do Jamboree Brasil Café uma das atividades mais esperadas foi o Desafio Mestre de Torra, onde cada desafiado tinha de torrar um café em torrador bola!
Foi simplesmente incrível o que se viu: mestres de torra que mantiveram controle da chama de forma rigorosa, observando as diferentes etapas da torra do café, além da alteração da rotação do torrador. Uma perfeita simulação do que um torrador industrial faz.

Existe diversas formas de torrar as sementes do café, bastando sensibilidade e conhecimento para que os resultados sejam excelentes.
Da mesma forma, novos métodos de preparo são lançados a todo momento, ampliando as possibilidades de exploração do sabor e aroma de cada lote de café. Todos são ótimos, bastando conhecer como trabalhar com cada um corretamente. Não existe o melhor, mas, sim, aquele com o qual você mais se identifica e, por isso, você elege como o predileto.

Melhor é status de momento e preferência.
Confie sempre em seus sentidos.
Se a experiência foi boa, siga em frente!
Afinal, toda forma de café vale a pena!  

 

 

Fazedores e a 4ª Onda do Café

Ensei Neto

Conjunto de Coquetelaria, L. Ferré.

Conjunto de Coquetelaria, L. Ferré.

O meu grande Companheiro de Viagem Daniel Kondo me comentou um dia sobre um amigo seu que era um aficcionado por drinques, mas tão aficcionado que fazia questão de conhecer bares icônicos por suas criações. Foi quando ele me apresentou ao Luiz Ferré, que é produtor artístico e um autêntico geek da coquetelaria!
Ao escolher um coquetel, Ferré inicia sua pesquisa com um minucioso estudo de sua história e dos seus componentes, além dos conceitos envolvidos. Daí parte para o mundo em busca dos endereços para experimentar as melhores execuções. Em seguida, faz a seleção dos ingredientes e começa uma rotina de treinamento rigoroso até que, "shazam", a química sensorial se mostre perfeita!
A primeira bebida que ele preparou foi um Negroni, que apesar de sua aparente simplicidade, envolve rigor técnico quase sublime para que o equilíbrio dos diferentes sabores se pronunciem harmonicamente.
E a experiência foi inesquecível!

Essa busca incansável de conhecimento de alta qualidade, que possa responder às questões mais simples e outras nem tanto, somada à sede de experimentar de tudo sobre o tema escolhido é o que caracteriza o espírito geek. Essa expressão, que começou com o pessoal de TI - Tecnologia da Informação, tornou-se um elegante sinônimo para os apaixonados que se tornaram quase obcecados pelo que fazem. O primeiro passo para despertar esse espírito geek, basta presentear as crianças com incríveis conjuntos como o Pequeno Laboratório Químico ou o Poliopticon, que permitia construir desde lupas a telescópios.
Brincar com as sutilezas das ciências da natureza desperta o gosto por aventuras cerebrais...

Em todos os campos, tudo começa com um determinado tema atraindo pessoas pela simples curiosidade, vindo a se tornar um hobby e, em seguida, uma paixão indômita.
E no café, esse movimento não foi diferente...

As chamadas Ondas do Café são identificadas pelo seu modelo de negócio junto ao consumidor.
A 1ª Onda se caracteriza pelo definição de um local específico de consumo, as Cafeterias, que tiveram sua origem ainda no Século XVII com o Café Florian. Esse modelo, que perdurou até os anos 1980, tinha no nome da cafeteria o seu principal símbolo.

A 2ª Onda se formou com as novas cafeterias a partir dos anos 1980, onde um personagem redesenhado conquistou o mundo: o Barista.
Profissional especializado no serviço de café, o barista ganhou destaque ao ter atividade ampliada junto ao consumidor, sugerindo novas experiências com diferentes origens de café. Sem dúvida, esta onda ganhou projeção com a fundação da primeira organização voltada ao mercado de cafés de alta qualidade, a SCAA - Specialty Coffee Association of America, que hoje tem o nome de SCA - Specialty Coffee Association, após fusão com a SCAE, entidade irmã da Europa.

A 3ª Onda iniciou o processo de aproximação entre cafeicultores e consumidores através das renovadas cafeterias e microtorrefações de cafés especiais, ainda na esteira da missão a qual a SCAA havia originalmente se proposto. A transparência nas relações comerciais, estimulando modelos comerciais como o Fair Trade/Comércio Justo, fez com que os consumidores passassem a compreender que a origem de excelentes cafés deveria ter seu devido reconhecimento. 

Certamente você deve conhecer alguém que começou a produzir pães de levain/fermentação natural em casa, bem como pessoas que passaram a receber os amigos para um jantar preparado em uma renovada cozinha repleta de equipamentos, panelas e facas de excelente qualidade, tal qual a cozinha de um restaurante exemplar.
Sim, o ato de cozinhar e receber mudou nestes últimos anos e, sem dúvida, fez com que as pessoas passassem a se dedicar à pesquisa de ingredientes e de receitas. Este é um claro sinal de amadurecimento do mercado.

A 4ª Onda do Café segue a mesma lógica.
Num passado recente, uma grande comunidade de Coffee Lovers e Coffee Geeks se formou no Brasil, inicialmente em pequenos grupos ou roda de amigos, ampliando-se para o espaço virtual até atingir um número de pessoas que surpreende. Essa comunidade é o Clube do Café, que abriga um surpreendente número de Coffee Lovers! 
É gente que fala de café com muita paixão, aliás muito autêntica por não se tratar sua atividade profissional! 
O que caracteriza essa comunidade de Coffee Lovers (os que estão começando) e Coffee Geeks (os que já são mais avançados) é a busca por conhecimento de alta qualidade, pelo compartilhamento de informações e conhecimento e, principalmente, pela avidez na busca por novas experiências. Sim, é um pessoal que entende que o saber é como o espaço sideral, sem fronteiras e que está pronto para ser explorado!
Muitos dos Coffee Geeks têm verdadeiras cafeterias em sua casa e hoje o que se observa é a verticalização estrutural, ou seja, assim como os Cozinheiros Domésticos, chegou o momento em que ter uma micro/nano torrefação doméstica é uma realidade!

É por isso que o tema do 4º Jamboree Brasil Café, que acontecerá nos dias 03 e 04 de junho próximo e é o primeiro e ainda único evento focado nos Coffee Lovers e Coffee Geeks, tem como mote "Você ainda vai torrar o seu próprio café!". Vislumbramos e percebemos a grandiosidade desse panorama e, por isso, a grade de atividades desta edição do Jamboree conterá toda a informação e conhecimento possível sobre esse tema. 

E para reforçar nossa visão do que é realmente essa a  4ª Onda do Café, veja este vídeo produzido pelo Roberto Pimentel, um Coffee Geek que adaptou um forno doméstico e o transformou num torrador de café:

Apresentação do Forno elétrico Kitchen Art Modificado para torrar café. Um breve sobre as modificações que fiz no forno e uma amostra e sugestão de torra no mesmo. Meu muito obrigado a todos os amigos do Clube do Café por compartilhar idéias e muito obrigado aos amigos pessoais e envolvidos que ajudaram a fabricar algumas peças.

 

 

Just $1 ou A vez dos produtos e serviços com preços justos

Ensei Neto

Balcão de serviços, Ristretto Coffee Roasters, Portland, OR.

Balcão de serviços, Ristretto Coffee Roasters, Portland, OR.

Cada geração de pessoas tem um comportamento característico, estilo de vida e visão que são profundamente estudados por empresas de marketing com o objetivo de desenvolver novos produtos e serviços em perfeito alinhamento. Desde a geração Baby Boomers, nascidos nas décadas de 1950 e 1960, passando pelas "X", "Y" e, agora, "Z", é observada notável mudança comportamental em razão da influência do ambiente tecnológico.
A chamada geração Y, nascida entre os anos 1980 e meados dos 1990, também tratada como Millennial por alguns sociólogos, mal viveu o ocaso das fitas de vídeo VHS e Betamax, seguido do impetuoso surgimento dos CDs, que substituíram fitas K-7 e discos de vinil, passando pelos DVDs e Blue Ray, até presenciar a migração de todo o acervo de som e imagem vivenciados para as nuvens. Individualista e competitiva, teve como referência produtos descartáveis, daí sua sede em buscar novidades de forma incansável. E esse apetite insaciável por experiências em padrões cada vez mais elevados, fez surgir o chamado mercado gourmetizado. 

A geração Z ou Centennial, para muitos sociólogos, é a primeira que efetivamente nasceu num ambiente altamente tecnológico, aprendendo a operar simultaneamente diversos equipamentos como smartphones, ipods e tablets. É um grupo de pessoas mais cético e, portanto, assertivo na busca de seus ideais, criando seus próprios caminhos. Minha filha faz parte dessa geração e uma das diferenças mais notáveis em relação à anterior é a percepção de que ela deve ser competitiva e colaborativa ao mesmo tempo.

Locol Food Truck. Foto da Página/Facebook.

Locol Food Truck. Foto da Página/Facebook.

O Companheiro de Viagem Rafael Tonon mantém um blog muito bacana, o What the Fork (http://www.whatthefork.com.br/), onde apresenta garimpagens, ou melhor, garfadas certeiras sobre as tendências do comer e beber. Leitura obrigatória! 
Em uma de suas últimas garfadas, Tonon comenta sobre o fenômeno Locol que está acontecendo na Costa Oeste norte americana. Nascida do talento empreendedor da dupla Daniel Patterson e Roy Choi, é uma rede de fast food que tem como missão oferecer bons produtos a preços acessíveis (Just Fair!), numa corrente contrária ao decadente mercado gourmetizado.
Dentre as novas ofertas, está, como seria de se esperar, um belíssimo café com inacreditável preço de $1 a xícara!
Quem está por detrás dessa incrível mágica é Tony Konecny, conhecido por Tonx no meio do café.

Tive a oportunidade de conhecer Tony em março de 2006, quando fazia dupla com Kyle Glanville, que viria a se tornar Campeão Barista dos Estados Unidos, na então promissora cafeteria Victrola, em Seattle, WA. Nesse primeiro encontro, já era possível perceber um brilho diferente em Tony, que se apresentava como The Coffee Evangelist.
Cerebral, Tony respondia pela área de compra de café verde e da torra do Victrola, porém tinha planos muito maiores. Num lance ousado, juntamente com Kyle, foram à Charlotte, North Carolina, onde aconteceria a feira da SCAA, em busca de novos horizontes. Logo após essa feira, onde tiramos uma foto que considero histórica por juntar campeões baristas dos Estados Unidos, incluindo Dismas Smith, e pessoas que se tornaram referência no mercado de café como David Haddock e Cris Davidson, a dupla Tonx & Kyle desligou-se do Victrola e seguiu rumo ao sul, mais precisamente para Los Angeles, CA, onde o então head do Intelligentsia, Doug Zell, pretendia expandir sua operação. 

Tony assumiu a seção de torra de café, que sempre foi sua paixão.
No início de maio de 2007, a unidade de San Fernando do Intelligentsia, arredores de Los Angeles, estava sendo inaugurada em grande estilo e lá estava ele, Tony, apresentando orgulhosamente um lendário torrador Probat da década de 1950/1960 que ele próprio garimpou, tendo acompanhado a reforma desde a definição da tecnologia embarcada aos retoques de estilo, como a inconfundível logomarca do Intelligentsia em forma de asa.
Talvez pela sua impetuosidade e desejo de acelerar os acontecimentos, Tony acabou se desligando dessa operação precocemente. Porém, sua maior ambição era o de transformar o mercado por atividades e atitudes transparentes, inovadoras e, principalmente, de inclusão.  

O tempo passou e o mercado de cafés especiais começou a experimentar um movimento aparentemente incoerente entre a pregação e a prática.
O amadurecimento do segmento dos especiais incorporou cacoetes típicos do grande mercado, onde a propaganda e "boas histórias contadas" se tornaram mercadoria obrigatória para justificar os preços crescentes ao consumidor com um produto nem sempre compatível, semelhante ao surgimento do raio gourmetizador na culinária.
Basta observar como cresceu o número de empresas especializadas em comércio de cafés especiais, muitas das quais braços das grandes e tradicionais casas exportadoras.
Depois dos exageros, o consumidor começa a perceber que nem todas boas histórias se sustentam, conduzindo-o ao chamado consumo racional ou do bom senso.
Por outro lado, as cafeterias que despontaram no mercado como inovadoras, tinham na oferta de cafés excelentes a preços muito acessíveis sua principal característica. Ou seja, cresceram pelo movimento de pessoas apaixonadas por café que buscavam boas experiências por preços muito razoáveis. Just fair!
Assim foi com a Stumptown e Ristretto, de Portland, OR, o Intelligentsia, de Chicago, IL, e Ritual, de San Francisco, CA, cada qual em seu respectivo período romântico. As filas intermináveis sempre foram o indicativo do excelente giro que as primeiras casas tinham, com base numa excelente relação custo/benefício.

Tony, agora com o projeto Yes Plz e o pessoal do Locol, mostra que é possível retomar a essência do que é fazer o "just fair" no mercado de cafés especiais.

No Brasil, também algumas pessoas estão trilhando por essa mesma via, apostando na oferta de cafés muito bacanas a preços que são muito razoáveis. The Little Coffee Shop, em São Paulo, Baden Cafés Especiais, de Porto Alegre, Fábrica Café, de Maceió, e Curto Café, no Rio de Janeiro, são excelentes exemplos!
E esperamos que esse novo movimento ganhe espaço progressivamente, para a alegria dos cafeicultores e dos consumidores, pois somente uma larga base de consumo pode garantir a continuidade de uma cafeicultura de excelência nas origens.
 

      

O Carrossel Holandês, o Ponto Futuro e as firulas...

Ensei Neto

Garotos que adoravam futebol com quem fiz amizade. Jabal Bura, Yemen, 2010. 

Garotos que adoravam futebol com quem fiz amizade. Jabal Bura, Yemen, 2010. 

1974. Talvez nem todos tenham vivido a experiência de assistir aos jogos da Copa do Mundo que aconteceu na Alemanha, mesmo que pela tv. 
A seleção brasileira vinha do êxtase da conquista do então inédito tricampeonato com um grupo de jogadores que ficou para a história. A base foi mantida para a Copa de 1974, bem como o técnico Zagalo, que comandou a inesquecível seleção de 70. 
Como inovação, a seleção de 74 tinha um comitê técnico que contava com Claudio Coutinho como seu supervisor.

Naquela época havia o sombrio clima da Guerra Fria, que representava a polarização entre os Estados Unidos e a ex-União Soviética como regimes dominantes. Diversas competições esportivas, como os Jogos Olímpicos e a Copa do Mundo de Futebol, serviam de palco para medir a eficiência de cada sistema.
Eram, por exemplo, duas Alemanhas, a Ocidental, que, apesar da pura ironia quanto à localização geográfica que lhe nomeava, era alinhada com a OTAN e, portanto, os Estados Unidos, enquanto que a Oriental o fazia com a ex-União Soviética.

Como direito adquirido pela conquista do certame anterior, a seleção brasileira foi dispensada da participação das eliminatórias regionais, tendo ingresso direto à Copa. A falta de treinamento dos jogadores brasileiros aliada à maluca idéia que o talento sempre se sobrepunha ao esforço, fez com que o desempenho da seleção canarinho fosse um desastre.
Por outro lado, havia uma outra seleção que fazia de cada jogo uma apresentação de gala, de alto nível técnico e aparente algazarra tática: a Holanda, que ficou conhecida como o Carrossel Holandês e também como a Laranja Mecânica (devido à cor do uniforme), comandada pelo talentoso Johan Cruijff. A Holanda massacrou o Brasil, apesar do placar de 2 x 0 não corresponder ao que se passou em campo.
Depois do fiasco, a seleção brasileira mudou de técnico, assumindo o posto Claudio Coutinho, que foi responsável por trazer o modelo europeu de futebol para a escola brasileira. Muito culto, Coutinho, porém, pecava com sua linguagem quase interestelar com os jogadores, como o "ponto futuro" e overlapping.
Do chamado "futebol arte" a seleção do Brasil passou a jogar um futebol burocrático e truculento. Talvez por isso mesmo e devido ao fracasso na Copa da Argentina, em 1978, a carreira de Coutinho na seleção não foi longa. Sua última grande frase foi "o Brasil é o campeão moral", pois o time saiu invicto da Copa, apesar de amargar o terceiro lugar.

Sementes torradas em resfriamento.

Sementes torradas em resfriamento.

Nos últimos tempos o mercado de café vem caminhando com desenvoltura devido ao consistente crescimento de consumo via novos países aderindo ao movimento dos cafés de alta qualidade ou especiais. Em países onde o consumo já está em sua fase madura, um movimento de gourmetização tem avançado como forma de supostamente demonstrar um viés hermético que alguns jovens hipsters podem adicionar.
Novos termos foram adicionados ao cardápio de café como "extração autoral", quando um desvio no método escolhido poderia ser interpretado como uma releitura.
Até aí, nada demais, pois é justamente a criatividade humana que torna toda atividade vigorosa e perene. No momento em que se esgota a possibilidade de reinvenção de um mercado, ele se extingue.
O que deve ser sempre levado em conta são os exageros, quando a boa técnica e conhecimento são relevados ante puro marketing, que é reforçado pela superexposição que os Snapchats, Instagrams e Facebooks da vida proporcionam. 

Recentemente, surgiram postagens com novos mestres de torra usando máscara contra gás (isso mesmo, você não leu errado: "usando máscara contra gás"!) durante a torra de café!
Embora tivessem um longo texto fazendo apologia à peça que estavam encenando, havia evidente incoerência e desconexão com a Ciência.
A encenação foi muito infeliz!

Joel Pollock, exímio Mestre de Torras, quando estava na Stumptown, de Porland, OR, conferindo os aromas de uma etapa da torra de café.

Joel Pollock, exímio Mestre de Torras, quando estava na Stumptown, de Porland, OR, conferindo os aromas de uma etapa da torra de café.

A torra artesanal do café, que é aquela de pequena escala (até 60 kg), permite a possibilidade de acompanhar cada etapa através do desfile aromático.
Logo, usar uma máscara contra gás é no mínimo hilário ou de dar dó...

O passo seguinte é vender os cafés torrados a preços exorbitantemente autorais, mesmo que a bebida resultante seja sofrível. Isso tem começado a afastar o consumidor comum ou iniciante, que simplesmente procura um bom café ou uma boa experiência, sem que para isso seja tratado como displicência. 
Bom mercado é aquele que se sustenta pelo seu crescimento orgânico, que acontece através da adesão de novos consumidores. Portanto, ter simplicidade e clareza ao falar de café é o que torna o mercado atraente.

Há pouco tempo a McDonald's UK/McCafe lançou um divertido vídeo sobre a postura hermética que algumas cafeterias e respectivos baristas vêm imprimindo ao mercado.
Vale pela reflexão, não pelo café.

The coffee market has got a bit over-complicated, hasn't it? But with McCafé, there's none of the frills or fuss. Only freshly ground beans, making great tasting coffee. It's simple. To find out more visit: http://www.mcdonalds.co.uk/content/ukhome/mccafe.html

Deve haver, sim, criatividade sem burocracia, inovação sem pedantismo, mas, principalmente, sem se afastar do conhecimento científico, que valida tudo o que é feito. 

Simplicidade sempre!
Sem firulas, nem overlapping ou ponto futuro...
 

O futuro é o passado

Ensei Neto

Sementes de café.

Sementes de café.

Produtos tem seu início, seu apogeu e, na maioria da vezes, experimentam o completo esquecimento. E no mercado de consumo, vez por outra, é feita uma releitura de um produto que pode vir a chamar novamente a atenção de todos, mesmo que de forma efêmera como fogos de artifício.

O Japão teve entre os anos 1970 a meados de 1990 a sua consolidação como um mercado muito sofisticado. Grifes de jóias, roupas, carros e produtos alimentícios se instalaram nas principais avenidas das grandes cidades nipônicas como chamariz para aventuras que poderiam se completar nos países europeus.  
Por exemplo, graças a um refinado plano de marketing da maior indústria de torrefação de café do Japão que duas origens ganharam fama pela sua raridade e elevados preços: o jamaicano Blue Mountain e o café da ilha de Kona, parte do 50º Estado dos USA.
Combinado perfeito: produção restrita em local de pequena extensão, controle da produção e uma boa história para contar.

Nesse período, o mercado de Cafés Especiais sequer existia, porém no País do Sol Nascente sempre aconteciam lançamentos de produtos que pudessem justificar maior sofisticação.
Em meados dos anos 1990, uma das grandes importadoras de café daquele país lançou uma série especial de café produzida em uma grande fazenda do Sul de Minas e que tinha como mote o fato de ser um "Vintage Coffee", com um sabor elegante que remetia às grandes fazendas de café do Brasil.
Um dos hábitos que os cafeicultores mais tradicionais cultivavam era o de guardar o café colhido em côco em gigantescas tulhas de madeira por algumas safras, até encontrarem o melhor preço de venda. Tulhas antigas que podem ser encontradas em centenárias fazendas do Sul de Minas eram feitas de madeira nobre, de grande resistência e, por isso, com poucos e raros poros.
O longo tempo de descanso nessas tulhas era fundamental para que as sementes de café, todas ainda em côco (naquela época, o Natural era praticamente o único processo de secagem no Brasil), tivessem a umidade ajustada. Por outro lado, em razão da grandiosidade dessa tulhas, não havia circulação de ar para boa parte das frutas, levando a um processo respiratório bastante lento. 

Semente boa para se torrar é semente viva. Semente morta perdeu a sua "essência", ficando em destaque o gosto da celulose, reconhecida também como gosto de madeira. 
Um processo como esse, de muito tempo com o café em descanso, pode, sim, ter ao final algumas sementes mortas, mas, caso se tenha um excelente controle de processo, principalmente com a manipulação da temperatura e uma respiração restrita, a bebida resultante pode ser muito interessante, desde que o lote seja de sementes de frutos colhidos maduros em sua grande maioria.
Com o tempo de armazenagem e convívio entre a casca externa e a semente, mesmo tendo o pergaminho como elemento intermediário, notas de aroma/sabor típicas das encontradas numa casca seca acabam migrando para as sementes.
É isso que permite identificar quando um café descansou por longo tempo nas tulhas.

Recentemente foi lançado um produto com esse tipo de proposta: Café Vintage (3 anos) pela divisão de café em cápsulas, Nespresso, da gigante suíça Nestlé. Segundo a descrição do processo, nota-se que segue fielmente esse enredo, numa releitura que os japoneses faziam há mais de 20 anos atrás.
Armazenamento por longo tempo das sementes cruas.
Sendo sementes bem colhidas, secadas e selecionadas, o resultado é sempre bom.   

A outra novidade vem com o Martins Café, do nerd Mariano Martins, com seus micro nano lotes em latinha. Para uma experiência "menos áspera", pede para deixar o café descansando, principalmente o Ketônico, para conferir uma "amaciada" em sua personalidade. Neste caso, o "envelhecimento" é para o produto já torrado e moído, que pressupõe que uma longa conversa com o ar (na verdade, o oxigênio), dará ternura à bebida, num efeito semelhante a uma decantação de vinho.

Esses lançamentos mostram que o mercado de café segue vigoroso, pois além do maior interesse do consumidor, de mais conhecimento compartilhado, produtores, pesquisadores e mestres de torra buscam novos caminhos para tratar dignamente o café!

 


 

A sinistra presença do sal nas bebidas

Ensei Neto

Loja de Sais, a maior do Japão, em Naha, Okinawa.

Loja de Sais, a maior do Japão, em Naha, Okinawa.

A Água Potável é diferente da Água Pura, que é aquela que, como aprendemos desde as primeiras aulas de Ciências, é incolor, inodora e insípida, pois tem gosto. Esse gosto, que é particular de cada água, é definido pela sua composição química, que é seu o conjunto de minerais. É justamente por essa característica que a água mineral é um excelente exemplo de Produto de Território, uma vez que não existem duas águas com a mesma composição.

As fontes de águas minerais são altamente dependentes do regime de chuvas, que, por sua vez, é resultado dos humores climáticos que são influenciados por fenômenos como o El Niño e La Niña. Boas fontes estão localizadas em locais afastados de áreas urbanas, preferencialmente cercados de matas nativas ou recompostas para sua preservação.
Por tudo isso, a água doce ou potável se tornou um valioso produto, razão pela qual as grandes corporações passaram a adquirir fontes em diversos países, inclusive no Brasil.
Os principais negócios dessas grandes corporações eram centrados em segmentos como o de lácteos e de refrigerantes, sendo que estes tiveram uma explosão de consumo a partir do final dos anos 90 em nosso país. Ao perceberem o apelo crescente do segmento da alimentação mais saudável, não perderam tempo em desenvolver novos produtos ou simplesmente incorporar marcas consagradas ao seu portfólio.
Foi a partir do início dos anos 2.000 que as bebidas para o consumidor jovem passaram a experimentar grande expansão através de lançamentos de enorme gama de produtos, como as lácteas prontas para beber, chás, achocolatados e águas adicionadas de aromatizantes, além de sucos em latas e embalagens longa vida.

Mas, algo vem me incomodando ultimamente: a crescente oferta de bebidas com alto teor de sódio, inclusive águas minerais!
No curso Educação Sensorial para Apreciação de Bebidas & Alimentos, um dos tópicos é o de apreciação de águas minerais, além do aprendizado sobre suas características químicas e sensoriais. São empregadas entre 6 e 8 marcas de águas minerais de diferentes fontes e, consequentemente, composições químicas, para os exercícios sensoriais. Passamos, em razão disso, a monitorar as diferentes fontes que estão sendo exploradas e disponíveis no mercado. Algo sinistro pode ser percebido...

Uma das empresas líderes do mercado de águas minerais tem apresentando sistematicamente produtos de fontes com elevado teor de sódio. O que preocupa é o fato de que boa parte tem teores de sódio acima de 30 ppm (partes por milhão) ou 30 mg/l, chegando a quase 40 ppm!
E isso se estende à sua chamada linha “premium”, que só se diferencia pela garrafa menor, de melhor apresentação e, por isso, mais cara. As fontes com os maiores teores de sódio são as que estão produzindo essa linha.
Tenha certeza de que Não é pequena essa concentração...
Até parece algo orquestrado. Ou para “educar” sensorialmente o consumidor.

Vamos ver o que se passa com outros produtos...
Observe na foto abaixo a composição de 3 produtos dessas grandes empresas que comentei. A partir da esquerda, observe que esse produto tem impressionantes 160 mg de sódio e 27 g de açúcar em 200 ml; o segundo conta com 116 mg de sódio e 12 g de açúcar em 200 ml também; finalmente, 19 mg de sódio e 25g de açúcar em 340 ml. 

Composição dos produtos: Sódio e Açúcares em altos teores!

Composição dos produtos: Sódio e Açúcares em altos teores!

A Organização Mundial da Saúde recomenda como dose máxima diária 5 g de sal, dos quais, 2g (= 2.000 mg) correspondentes ao Sódio.
Deu para assustar, não?!

O sódio exerce um papel muito importante na percepção dos gostos, pois trabalha como uma chave que tem o poder de abrir ou fechar as portas da percepção. E seu efeito mais notável é certamente com o gosto Amargo.
Em produtos como o café e o chocolate, o sabor amargo é claro indício de que algo está mal. Não é um sabor que naturalmente se deva esperar, pois em geral o amargo está ligado com perigo e risco de vida para nós, sendo que nossa sensibilidade é muitíssimo mais alta em relação ao sabor doce, aproximadamente 10.000 vezes.
É um sabor básico que é  naturalmente rejeitado por nós porque está associado com os venenos naturais, que são alcalóides. Quando ingerimos algo que tenha predominantemente o gosto amargo, nosso corpo responde automaticamente com diversos movimentos para sua expulsão. 
Portanto, adicionar doses generosas de açúcar refinado ou de adoçantes numa bebida assim, nada mais é do que mascarar o problema.

Tanto para o café quanto para o chocolate, o sabor amargo com característica medicinal (que lembra a dipirona ou um tenebroso creosol) é devido à presença de sementes que apodreceram. 

No caso do café, isso pode ter ocorrido ainda na planta, depois que a fruta começou sua fase de senescência (fase “passa”) sob alta umidade relativa do ar. É podridão na certa, como pode ser visto abaixo, com o fruto apodrecido no ramo e a semente em processo de necrose.
Quando se trata do chocolate, o problema é devido à Vassoura de Bruxa, fungo impiedoso com as lavouras cacaueiras e que faz o estrago sensorial. Veja a foto a seguir.

O ataque da Vassoura de Bruxa corresponde aos veios pretos, onde os fungos ficam alojados.

O ataque da Vassoura de Bruxa corresponde aos veios pretos, onde os fungos ficam alojados.

E onde entra o sódio nisso tudo?
No momento em que o produto industrial é desenhado, as indústrias, para obterem o máximo de lucro, trabalham com matérias primas baratas. Não há milagre: na Economia há uma lei que diz que “para alguém ganhar, outro está perdendo...”.
No caso, são os consumidores, que pagam por algo supostamente bom e que, na realidade, não é!

A adição do sal de cozinha, onde o sódio corresponde a 40% da composição, nas receitas de achocolatados, bebidas à base de chá e até de cafés, tem como objetivo o de “enganar” nossa capacidade de avaliação sensorial, pois efetivamente “fecha as portas” da percepção do gosto Amargo devido às matérias primas de baixa qualidade.
Uma vez que essa sensação ruim foi minimizada, basta adicionar uma generosa dose de açúcar e.... voilá, tudo parece maravilhoso!!!
Nossos sentidos estão sendo taxativamente enganados por uma estratégia que envolve sofisticado grau de conhecimento de como nosso corpo funciona pelas grandes empresas. Sim,  de saudável não estão a oferecer absolutamente nada, muito pelo contrário.

Tudo isso nos passa a sensação de que estamos à mercê de verdadeiras bombas relógio que explodirão nossa saúde, como um surto de hipertensão ou no surgimento de uma leva crescente de diabéticos. 
Como sugestão, leia os rótulos dos produtos que você compra, para ter noção do que será consumido. A relação entre as águas com elevado teor de sal, em tal concentração como nos achocolatados, chás e bebidas com café, nos levam a pensar que tudo não passa de um sinistro plano para adaptação do nosso paladar a esses produtos.

Seu corpo é tudo o que você tem e é importante que ele funcione perfeitamente sempre. Portanto, todo cuidado é sempre bem vindo.

Cautela e canja de galinha sempre fazem bem...

 

 

 

 

 

 

 

O fim dos tempos

Ensei Neto

O ser humano, desde as eras imemoriais, tem dado atenção muito especial aos grandes eventos que o levam a pensar sobre o fim dos tempos. O ano de 2012, em particular, teve uma enorme quantidade de filmes lançados tratando sobre o tema como há muito não se via, impulsionados pela crença maia de que o mundo acabaria em Dezembro de 2012.
Eram esperados incidentes climáticos tão grandiosos como os vistos também no cabalístico “O dia depois de amanhã” (The day after tomorrow), que previa que o degelo das calotas polares poderia provocar alteração climática tão violenta que provocaria inundações e tempestades tropicais em escala que ficariam, digamos, “fora da escala” conhecida...
O clássico filme de Stanley Kubrick “2001 – Uma odisséia espacial”, baseado em romance do genial Arthur Clarke, que influenciou a imaginação de gerações e mesclava belíssimas imagens siderais com músicas de grandes compositores como Strauss e sua “Danúbio Azul”, também tratou o tema do fim dos tempos ao dar transcendência ao astronauta David Bowman que, depois de derrotar o incrível computador HAL 9000, se tornou o primeiro de uma nova raça.

O ano de 2013 começou normalmente, com um belo nascer do sol em diversos lugares, num claro sinal de que o mundo continuava a rodopiar o seu balé sideral. Então, afinal, para quando fica o fim dos tempos?

No princípio da década de 1980, o mercado norte-americano de café passava por período com nítida sensação de final dos tempos, pois estava acontecendo grande concentração das indústrias torrefadoras. Os novos conglomerados tinham como foco o simples aumento de lucros através da piora gradativa da matéria prima empregada, por isso mesmo mais barata, para que os consumidores tradicionais não percebessem a alteração da bebida. Baseados em estudos de neurociência, as indústrias que lideraram esse maléfico projeto sabiam que alterações sutis não seriam percebidas pelo consumidor normal, aquele que bebia o café como um ato mecânico contínuo.
Ótimo para turbinar lucros, a princípio.
No entanto, esqueceram-se de que o mercado é estruturado a partir da renovação dos consumidores e o que se viu foi uma não entrada dos jovens nesse mercado de pura tinta negra. Vendas decrescentes num cenário nefasto de preços baixos ou, como são referidos em marketing, muito competitivos. Um típico cenário de fim dos tempos...


Foi nesse momento que surgiu um movimento de contracultura com idealistas importadores e algumas pequenas torrefações na fervilhante San Francisco, California, que acreditavam nos cafés de alta qualidadee no relacionamento direto com os produtores. Sob a inspiração de uma genial senhora, Mrs. Erna Knudsen, foi cunhado o hoje emblemático nome de Specialty Coffee para uma associação que nascia para um novo tempo, a SCAA – Specialty Coffee Association of America.

No início da década de 1990, começou no Brasil, depois replicado nos outros países fornecedores, um modelo de comércio de café que se tornaria rapidamente uma referência em boa parte devido ao carisma de um químico apaixonado por café, Dr. Ernesto Illy.

Preocupado com os baixos preços vigentes (para se ter uma idéia, a saca de 60 kg de café cru era vendida a US$ 36 !!!), que estavam a uma distância olímpica da capacidade para cobrir os custos de produção, fazendo uma leva de produtores abandonarem a atividade, Dr. Illy instituiu um concurso de qualidade e uma política de preços de compra com bom prêmio pela qualidade do lote de café, que ainda hoje está a anos-luz de boa parte do que se pratica no mercado.
Sob a batuta desses dois movimentos, o mercado de café iniciou novos tempos, baseado no chamado Comércio Direto (Direct Trade) e na premiação pela maior qualidade do lote de café.

Já no início dos anos 2000, o preparo da moda era o espresso, que conquistava muitos adeptos justamente pelo desafio imposto pela dificuldade de se fazer uma prosaica extração. O campeonato mundial de baristas cresce e se torna um evento muito importante para o mercado, auxiliando na difusão da cultura do café através das mídias alcançadas.

Em razão disso, esse período foi marcado pela fé de que um excelente café seria aquele servido como espresso em detrimento de outros serviços. Parecia o fim dos serviços de café de filtro.
Porém, esse mesmo momento, uma empresa japonesa baseada em Tokyo e especializada em vidros especiais e de laboratório teve um de seus produtos, na verdade um conjunto composto por uma belo jarro e um porta filtro, ambos de vidro especial, e uma chaleira em aço inox com um sinuoso e longo bico, percebido como um novo caminho para os serviços de café!

Durante o WBC de 2005, em Seattle, WA, um grupo de baristas apresentou o sistema Hario para serviço de café coado, que logo arrebatou uma legião de adeptos. Coincidentemente, o barista campeão foi o representante do Japão, Mr. Kadowaki.
Esse retorno ao coado foi muito importante porque fez com que os baristas se tornassem efetivamente profissionais dos diferentes serviços de café e não apenas do espresso. Assim sendo, ganhou o mercado, pela possibilidade de novas ofertas de serviços de café serem oferecidas, e os Baristas, que com isso ganharam pela valorização de sua profissão.
Sem dúvidas, novos tempos se abriram!

Como num sincronismo cósmico, um impressionante trabalho desenvolvido pela gigantesca empresa suíça Nestlé, inicia nessa mesma época uma agressiva expansão daquela que viria a ser sua divisão mais rentável e destacada, a Nespresso e seus cafés em cápsula.
Seus méritos: uma cápsula que para sua confecção empregou conhecimentos equivalentes a um completo curso de engenharia e ciências, máquinas compactas com belo design e uma sofisticada estratégia de marketing.
Rapidamente as máquinas se tornaram objeto de desejo entre os novos adeptos do café, ganhando posição de destaque em salas e escritórios. No entanto, um outro elemento fez com que olhos que antes não viam no café uma bebida simpática, passassem a venerar as coloridas cápsulas metálicas. Esse tipo de serviço proporcionou, pela primeira vez, o acesso a número sem precedentes de novos consumidores a cafés de diferentes origens, sempre acompanhados de campanhas promocionais muito criativas.
É um projeto que denominamos “matador”, pois teve mérito em reunir num só produto beleza na apresentação, facilidade de operação, perfeita dosagem de insumos (inclusive da preciosa água), diversidade de opções e xícaras com resultados sempre previsivelmente estáveis. Essa combinação é a mais desejada por donos de restaurantes, bares, hotéis e escritórios, pois, além do excelente controle administrativo que o sistema oferece, dispensa mão de obra especializada para sua operação.

Seria o fim dos tempos para os baristas e dos outros serviços de café?

O ser humano, como sempre costumo apresentar em minhas aulas de Educação Sensorial, é uma maravilhosa máquina de avaliação sensorial de bebidas e comidas! Assim sendo, ao mesmo tempo que o nosso paladar pode perceber sutis alterações, por exemplo, em um mesmo café preparado por diferentes pessoas, há uma evolução natural do, digamos, equipamento, que se aperfeiçoa com os anos devido ao aumento exponencial de sua biblioteca de memórias das sensações vividas dia após dia. É por isso que buscamos sempre novas experiências.
Podemos considerar a Nespresso e suas cápsulas como um excelente exercício pedagógico, ensinando a novos amantes do café que a diversidade é quase infinita quando se trata de origens, variedades, processos de produção e elaboração de blends de café. Quando essa pessoa começa a compreender melhor a imensidão que é a cultura do café, está preparada para novos tempos...

Portafiltro sobre Acaia Scale.

Portafiltro sobre Acaia Scale.

O conhecimento liberta e nos faz entender que sempre há muito o que aprender, despertando a curiosidade sobre os temas e tudo que se liga a eles, numa espiral de busca sem fim. Isso é ótimo, pois mantém a perspectiva de que novos produtos e novos métodos de preparo, por exemplo, sejam constantemente apresentados.

Uma corrente de serviços e produtos vem inundando o mercado com muitas novidades, desde balanças com acionamento por um smartphone a um jogo de peneiras de uso doméstico para separar partículas de café moído e, assim, obter extrações com grupos mais específicos de sabores. Incrível a que ponto de sofisticação nos preparos domésticos estamos chegando. Da mesma forma, as novas cafeterias tem balcões específicos para serviços de coados com jovens hipsters com suas barbas e camisas em padrão xadrez ou baristas em clássicos trajes gravata e suspensórios procurando explicar as histórias de cada grão sob preparo aos clientes. É um tempo muito estimulante e que parece que será bastante longo...

Yuri Pinotti.

Yuri Pinotti.

Recentemente em São Paulo, uma loja foi aberta com um conceito inovador no mercado de café: a Tem Café, do coffee lover Yuri Pinotti, produtor de café em Pardinho, SP. Este empreendimento tem como diferencial o fato de oferecer cafés produzidos por cafeicultores de todo o Brasil e apetrechos para o preparo doméstico, sem qualquer serviço a não ser para a degustação dos produtos.

Na verdade, o fim dos tempos está mais associado à falta de capacidade de um determinado setor ou organização se atualizar, levando-os à agonia e, efetivamente, ao seu fim.
No entanto, o olhar atento aos sinais que o mercado dá, a compreensão do que os jovens querem dizer com seus cabelos coloridos e de corte assimétrico ou mesmo o aprendizado ao manejo dos novos meios de comunicação faz com que as organizações se mantenham no melhor da onda, navegando intrepidamente os mares dos novos tempos.

 

 

 

Athos, Maurice e os Coffee Lovers

Ensei Neto

Athos Bulcão foi um dos mais talentosos artistas brasileiros, finamente ligado às formas geométricas para criar belíssimos mosaicos.
Carioca, estudou medicina, mas logo descobriu que não seria esse o seu futuro e, para o bem dos apreciadores das belas artes, resolveu se dedicar ao estudo das artes visuais.
Trabalhou com Cândido Portinari, que lhe abriu os horizontes criativos, e com Oscar Niemeyer, que lhe permitiu alçar vôos para grandes envergaduras.
Os trabalhos de Athos ganharam notoriedade rapidamente e podemos considerá-lo como um Maurice Escher brasileiro, tal é seu talento em criar pictografias que levam a diferentes leituras de seus mosaicos, como este que está no Brasília Palace Hotel.

Mosaico de Athos Bulcão, Brasília Palace Hotel, Brasília, DF.

Mosaico de Athos Bulcão, Brasília Palace Hotel, Brasília, DF.

Este hotel,  que fica às margens do Lago Paranoá, tem seu imóvel tombado como patrimônio histórico, pois, além das linhas clássicas de Niemeyer, tem diversos trabalhos de assinatura do Athos Bulcão.
Você pode saber mais sobre sua obra através do website (www.fundathos.org.br) da Fundação Athos Bulcão.

Coincidentemente, será no salão Athos Bulcão do Brasília Palace Hotel o local do Jamboree Brasil Café/Centro Oeste, no próximo dia 19 de março.
Com uma programação bem dosada para os Coffee Lovers (iniciantes) e Coffee Geeks (avançados), esse evento começa com palestra do Rafael Tonon, jornalista que escreve sobre comportamento e gastronomia, além de ser um apaixonado por café, que aborda os novos rumos que cafeterias de ponta do mundo estão mostrando.
Depois dele, eu comentarei sobre o tamanho das partículas do café moído e o que se pode esperar como resultado na xícara. Mostrarei fotos macro e microscópicas muito bacanas!

Catedral de Brasília, Daniel Kondo.

Catedral de Brasília, Daniel Kondo.

Na parte da tarde será a vez dos Laboratórios com quatro estações para que todos tenham experiências muito interessantes: harmonização de café e cachaças 1000 Montes, testes “mão na massa” com o moinho manual Bravo do Gilberto Santos Neto, uma introdução aos sabores das Regiões Brasileiras com a equipe Melitta e uma super apresentação com os baristas de Brasília e os diferentes métodos de extração de café.

O Congresso é Aeropress!, Daneil Kondo.

O Congresso é Aeropress!, Daneil Kondo.

O Jamboree Brasil Café, como comentei anteriormente, é um evento para consumidores apaixonados por café, sejam iniciantes ou avançados, por isso o conteúdo do evento procura atender a todos.

O premiado artista visual Daniel Kondo fará uma exposição muito divertida chamada de “Minha Vida Cafeínada”, que ilustra este post. Ah, e para aproveitar, faremos o lançamento da linha de produtos The Coffee Traveler by Ensei Neto, desenvolvido em aliança com o Órbita Estúdio.

Se você quiser saber mais sobre o evento e fazer inscrição, entre no website www.jamboreebrasil.coffee.

 

Mergulho Cafeínado 2, Daniel Kondo.

Mergulho Cafeínado 2, Daniel Kondo.

De volta para o futuro

Ensei Neto

Filtro Melitta em Porcelana, visto de cima. Clássico.

Filtro Melitta em Porcelana, visto de cima. Clássico.

Neste ano de 2015 comemorou-se 30 anos do lançamento de uma das mais deliciosas franquias de Hollywood: Back to the future, de Robert Zemeckis e os incríveis atores Michael J. Fox como Marty Mcfly e Christopher Lloyd interpretando o impagável Doc Brown.

O enredo flerta com a possibilidade de dar rumos distintos à vida presente ao promover pequenas mudanças no passado.
Marty tinha um pai fracassado, a mãe alcoólatra e uma irmã que não tinha amigos. Tendo como grande amigo um inventor muito maluco, Doc Brown, Marty o ajuda a registrar em vídeo cassete um experimento de viagem no tempo. Mas, um grupo de terroristas está perseguindo Doc Brown, tentando um mortal acerto de contas. No meio da confusão, Marty toma a direção do incrível De Lorean e ruma ao passado, 1955, encontrando seus pais ainda como colegiais.

Para evitar que sua futura mãe, ainda mocinha naquela época, se apaixonasse por ele, Marty faz com que seu pai se torne um rapaz de grande coragem, alterando significativamente o futuro. Seu retorno ao ano de 1985 mostrou que nada mais era a mesma coisa...

Na primeira sequência, a ação se passa no futuro, muito sombrio, como outros filmes daquela época tratavam o tema, como Blade Runner. Marty se torna novamente um perdedor e não vê saída sua vida. Um frenético vai e vem para o passado conserta a situação, mas que o obriga a ir nos tempos das diligências no último filme da série.

Mais do que o fascínio de viajar pelo tempo, tanto ao passado quanto ao futuro, certamente o que chama a atenção nessa trama é a importância de como os acontecimentos podem ser decisivos para o sucesso ou o fracasso ao longo da vida.

No Brasil, o mercado de café teve sua grande transformação com a chegada da alemã Melitta e seu filtro de papel, que mudaria para sempre a forma de preparar nosso clássico tupiniquim, o Cafezinho.
Originalmente, o Cafezinho é uma infusão, quando coloca-se o pó fino na água fervente (como um resgate do histórico Ibriq), passando-o por um filtro de algodão (geralmente flanela), que retem boa parte do pó, mas que permite passar um pouco dos óleos.

O sabor intenso do Cafezinho se deve a estes 3 fatores:

1)    à alta concentração (em torno de 5 colheres de sopa de café em pó = 95 g a 100g para preparar 1 litro de bebida);

2)    ao maior tempo de contato entre partículas das sementes torradas e moídas e a água; e

3)    à trama mais aberta da flanela, que permite a passagem também de óleos e eventuais micro partículas.

Junto de um inovador porta filtro de plástico (que na época tinha uma geometria ovalada mais fechada), a proposta era a de fazer a substituição gradativa do filtro de pano para o conjunto de papel. Seria perfeito a não ser por um detalhe crucial: nos anos 70 só se via nas gôndolas de supermercado um único tipo de produto: café torrado e moído em embalagem “almofada”, que é a mais simples e destinada aos produtos de valor mais competitivo.
Como característica básica dos cafés em pó no Brasil da época, só havia um tipo de moagem: muito fina!

Obviamente, os primeiros anos foram muito complicados, até que a própria Melitta lançou o primeiro café embalado a vácuo do país, com uma granulometria menos fina e mais adequada ao filtro de papel. Portanto, veio desse tempo o por quê da rejeição de muitos novos profissionais do café ao método Coado, pois o resultado sensorial, até então, levava a uma experiência pouco agradável.

O Coado ou Filtrado passou a chamar a atenção da turma mais geek do café com a chegada do Sistema Hario no Ocidente no final dos anos 1990, desenvolvido por uma empresa japonesa que atua no setor de vidrarias industriais. Com um design inovador, em cone de triângulo eqüilátero como um chapéu de palhaço e largas estrias internas, fez os Coffee Lovers compreenderem que o café Coado/Filtrado pode ser muito bacana, pois as variações vêm pelas sutilezas de moagens diferentes e na velocidade que a água quente é despejada. E isto para ficar somente com a mesma origem de café!

Mas, o tempo passa e todo reinado tem o seu fim. Hoje é o Sistema Kalita que predomina como um método de extração de café das cafeterias e consumidores descolados. A geometria do filtro é bem diferente, lembrando o formato de um papel onde se colocam brigadeiros ou beijinhos, só que bem maior. Fundo reto e laterais onduladas, semelhantes aos clássicos filtros da VP-17 da Bunn.

Na sempre antenada Los Angeles e arredores a história já está virando nova página. A badalada cafeteria Blue Bottle deixou de utilizar nos serviços de coado os Sistemas Hario e Kalita, partindo para os Melitta!
Sim, isso mesmo, a nova onda dos serviços de coado está no retorno dos porta filtros em porcelana da Melitta, primeiros historicamente do mercado, só que revisitados, com grãos de café moídos adequadamente e técnicas para verter a água quente mais refinadas.

No atual momento, ter uma Melitta, principalmente em porcelana, é sinal de pessoas e locais antenados, atualizados e descolados, e é certo que para esse também incrível sistema alçar grandes vôos aqui no Brasil deve, primeiro, resolver suas pendências do passado.

    

            

 

Pontos, ora pontos... mas não tão simplesmente pontos

Ensei Neto

150930-Adv Cupping.jpg

Os vinhos sempre mantiveram aura de especulativa intangibilidade por ostentar brasões ou nomes que remetem às tradicionais famílias francesas que souberam como poucas criar histórias espetaculares sobre uma bebida. A fama e o conseqüente alto valor alcançado pelas garrafas de vinho da Borgonha e Bordeaux, por exemplo, fizeram delas alvo do exército alemão durante a ocupação do solo francês, que se utilizava do confisco de produtos desse nível para consolidar o modelo de financiamento da guerra. O exército de Hitler mantinha em seus quadros especialistas em diversos campos das artes, inclusive da Gastronomia e dos vinhos, pessoas que sabiam perfeitamente distinguir ingredientes e produtos maravilhosos dos comuns. Por isso mesmo, diversos oficiais de sua confiança eram profundos conhecedores, por exemplo, de vinhos franceses. 
O livro “Vinho e Guerra”, de Don e Petie Kladstrup, retrata como essas famílias produtoras usaram criativas artimanhas para impedir que os alemães se apoderassem desses verdadeiros tesouros na forma de vinho numa narrativa deliciosa. Leitura que recomendo.

Beber café pode ser uma experiência divertida e até fantástica a depender dos grãos que foram selecionados para o seu preparo. Quem sabe se naquela época houvesse um local na Europa onde se produzisse excelentes cafés, o exército de Hitler não mantivesse em seus quadros um degustador de café?
E aí vem uma questão muito interessante, que desperta por vezes discussões longas e elevadas temperaturas: será tão complicado pontuar um café?

Certamente você já deve ter ouvido falar que existem experientes profissionais que são responsáveis pelo controle de qualidade dos cafés que são exportados e que o fazem numa longa bateria com grande número de xícaras transparentes em enormes mesas girantes sob sonoros assobios... 
É esta é a imagem que a grande maioria dos produtores tem dos laboratórios de prova de café das grandes empresas compradoras. Muitos acreditam que quanto mais alto é o assobio, mais competente deve ser o degustador...
Ah, sim, esta é mais uma das lendas urbanas do cafés!

Para a grande e absoluta maioria dos lotes de café que são comercializado no mercado passam por essas empresas e, portanto, por essas bocas especializadas numa metodologia de prova conhecida por COB – Classificação Oficial Brasileira e que é muito próxima da metodologia praticada na NYBOT - New York/Board of Traders. Cooperativas, exportadores e muitos dos corretores que estão no mercado avaliam café sob essa régua. Como trabalham com grandes volumes de café verde (= green coffee/cru), com lotes que englobam até 3 mil ou mais sacas de 60 kg, por exemplo, operacionalmente é muito mais fácil padronizar os lotes a partir da ausência de defeitos numa bebida.
Nos anos 90, ao se criar o SCAA Technical Standards/Comitê de Normas Técnicas da SCAA – Specialty Coffee Association of America, surgiu a idéia de se criar uma nova metodologia de avaliação sensorial de café, que foi desenhada durante longas conversas entre Ted Lingle, que foi o diretor executivo da SCAA por longos anos, e várias cabeças pensantes, entre elas,  George Howell, conhecidíssimo consultor de cafés especiais. Dessa troca de figurinhas saiu a primeira planilha de avaliação de café da SCAA, mas que entre o final de 2003 e início de 2004 foi levada definitivamente para a ACE – Alliance for Coffee Excellence, que organiza o concurso Cup of Excellence em todo o mundo cafeeiro, devido à saída de Howell da SCAA. Essa planilha, que tem como nota 8 a máxima por atributo, é a sua planilha oficial dos concursos CoE.

Essa ruptura permitiu que um grupo que havia a pouco ingressado no chamado SCAA/TSC, incluindo personalidades como Mané Alves, Steven Dias, James Kosalos e Orlando Garcia, pudesse promover importantes mudanças no Protocolo SCAA para Avaliação Sensorial de Café Verde (Cru). Tive a honrosa oportunidade de fazer parte desse grupo, mais precisamente do Subcomitê de Green Coffee e Certificações. Foi um tempo memorável, de incríveis discussões que fizeram aflorar todo o atual acervo técnico da SCAA.
A primeira grande alteração foi o fato de serem estabelecidos 10 atributos avaliados de um lote de café, todos com resultados que eram expressos numa escala, digamos, normal, que tinha como máximo a nota 10 e o mínimo, zero, com frações de 0,25. Dessa forma, um mega raríssimo lote poderia chegar a impensáveis 100 pontos SCAA... 
O problema dessa planilha era o lay out, que eu particularmente considerava (e ainda considero) um exemplo de confusão visual. Propus um modelo com lay out vertical que aprimorei a partir de uma criação de um talentoso degustador, Akio Yamaguchi.

Planilha SCAA atual versus Planilha Vertical, Ensei Neto & Akio Yamaguchi.

 

Infelizmente, essa planilha ficou apenas 6 meses como alternativa, retornando-se à anterior, que prevalece até hoje, após a posse do então novo coordenador do TSC. No entanto, para minha surpresa e satisfação, essa planilha é empregada por muitos profissionais, Q Graders, SCAA Cupping Judges ou não, porque torna mais fácil a compreensão dos atributos de um lote sob avaliação. 
Deixei o SCAA/TSC após cumprir o ciclo completo de 7 anos, quando devemos fazer um afastamento sabático de 1 ano. Nem todos retornam, como foi o meu caso, pois haviam diversos pontos que discordava, pois não eram coerentes com a Ciência dos Alimentos.

É por esta razão que gostaria de anunciar que estou lançando um novo curso de avaliação sensorial de café, o Curso de Avaliação Sensorial de Café para Especialistas.
Voltado para profissionais experientes, incluindo Q Graders e SCAA Cupping Judges, trabalharemos os fundamentos que originaram a mecânica da Metodologia SCAA, além de uma revisão que considero fundamental para todos aqueles que gostariam de desenvolver com maior precisão os parâmetros sensoriais.

Cupping sob iluminação modificada.

Cupping sob iluminação modificada.

Anote: de 26 a 28 de Novembro de 2015, no super completo Laboratório do Sindicafé de São Paulo, SP, a 1a Turma do Curso de Avaliação Sensorial de Café para Especialistas.

Será uma oportunidade de fazer uma rigorosa calibração dos parâmetros sensoriais sob moderna revisão técnica, sob a perspectiva da Fisiologia Humana. 
Para reservar seu lugar, converse com a Adriana através do telefone 11-3125.3160 ou pelo email cpcsp@sindicafesp.com.br
Em breve comentarei mais sobre este novo curso!     

Quem colocou manteiga no meu café?

Thiago Sousa

A Companheira de Viagem Natália Fernandes, que é a Coordenadora da Produção Agrícola do CNA – Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil, num dos últimos bate papos me perguntou sobre o que é BulletProof Coffee, uma das recentes manias nos USA.

Na verdade, sobre o BulletProof Coffee existem duas abordagens diferentes que podem ser feitas: a primeira, que é sobre como funciona (ou se funciona) esse produto, e a segunda, que tem relação direta com nossas respostas sensoriais. Então, vamos lá…

O BulletProof Coffee, criação do empresário Dave Asprey (www.bulletproofexec.com), é um produto, segundo ele, que aumenta a performance física e mental das pessoas através de um café de excelente qualidade adicionado de manteiga e o seu Brain Octane, que, a partir do nome, pressupõe-se que seja um combustível performático de alta octanagem para o cérebro. Na verdade, este produto é óleo de côco.

Asprey afirma que com o consumo regular de sua criação, conseguiu elevar seu QI em 20 pontos!

A base de tudo é um excelente café, isento de toxinas e outros problemas agregados devido à presença de sementes de baixa qualidade na composição. À parte das contaminação por terra (quando os frutos são colhidos depois de caírem ao chão) e que eventualmente ocorre contaminação cruzada por micotoxinas, os chamados Defeitos Capitais do Café são representados pela sigla PVA, que é a junção das iniciais de PretoVerde e Ardido.

Grãos Pretos são aqueles que apodreceram e conferem o inconfundível aroma e sabor medicinal que lembra a Dipirona em baixas concentrações ou, quando em teores elevados, a fétida Creosol (= Creolina).

Sementes Verdes, cujo efeito na língua lembra quando comemos um caqui ou banana verdes, possuem alta concentração de Alcalóides que funcionam como defesas naturais das plantas contra o ataque de insetos que poderiam provocar danos aos frutos. A mesma sensação cáustica que sentimos é também percebida pelos insetos, que, assim, deixam de se interessar pelos frutos que não estão maduros. (Observe que só o “bicho” Homem deliberadamente colhe frutos não maduros!)

Já o Ardido é a semente que sofreu fermentação Acética, conferindo à bebida o desagradável sabor do vinagre. É resultado de manejo inadequado dos frutos pós-colhidos.

Certamente, este é o ponto alto do café do BulletProof: um café de bebida de muito boa qualidade!

Adicionar Manteiga Sem Sal (que Asprey defende que seja de gado alimentado por capim) ao café equivale a adicionar creme de leite, o que resulta em sabor semelhante a um bom Café com Leite!

A propósito, esta é uma das grandes combinações que pode ser feita com o Café e que tem em variantes tão deliciosas como o Pão na Chapa ou um pão recém saído do forno recebendo generosa camada de manteiga…

A complementação com o óleo de coco por Asprey, tecnicamente, somente eleva o potencial calórico da bebida, o que obriga a uma boa sessão de exercícios ou de caminhada para queimar esse excedente energético. Talvez seja por isso mesmo que ele afirma que o BulletProof Coffee aumentaa performance física, pois para manter a forma depois de ingerir essa bomba calórica, a melhor solução é gastar com intensos exercícios!

Não é nenhuma novidade adicionar Manteiga ao Café e seu resultado é sempre delicioso.

Manteiga de boa qualidade é feita exclusivamente com a nata que deve ser batida para incorporar ar e, assim, ganhar volume e consistência. É como se faz com o sorvete de massa, mas à temperatura ambiente.

Essa combinação funciona muito bem quando o café é preparado a partir de sementes de excelente qualidade e, portanto, com abundância de açúcares, e a manteiga não tenha adição de sal.

Caso o café seja de qualidade duvidosa ou abaixo da média, quando algum dos componentes do “Trio Calafrio” PVA se faça presente, Manteiga com Sal pode ser a Salvação da Pátria Sensorial…

O Sódio que compõe o Sal de Cozinha (Cloreto de Sódio para os íntimos…) é um dos elementos mais importantes no quesito Estímulo Sensorial para o Gosto.

Nossas respostas aos estímulos gustativos são desencadeadas por processos químicos que acionam células com características semelhantes aos neurônios e, por isso, de ação específica. Nesse cenário, alguns íons ganham importância pelo fato de funcionarem como “chave” que pode abrir ou fechar portas da percepção.

No caso do Gosto Amargo, o íon Sódio funciona como uma chave que fecha portas, ou seja, atenua nossa percepção para aquele gosto. Incrível, não?

Caso o café que lhe for servido estiver amargo como fel, uma pitada de sal melhora a percepção. Porém, se o gosto amargo é devido à presença do devastador Creosol (Creolina, Medicinal/Dipirona), o sal pode minimizar o gosto Amargo, mas o estrago no estômago só poderá ser resolvido com o velho e bom Omeprazol…   

A torra clara, a torra escura e a pasta al dente.

Thiago Sousa

Existe hoje uma calorosa discussão sobre qual é a melhor técnica de torra de café, num embate que lembra um pouco uma competição entre torcidas.

A Torra do Café, como explico nos cursos, precisa de 3 elementos para acontecer: o Equipamento, aMatéria Prima e o Mestre de Torra ou Piloto de Torra (como prefiro chamar), que é a famosa “peça que fica em frente ao equipamento”…

Conhecer os recursos que o Equipamento, que é o Torrador, possui é fundamental para que uma boa condução pelo Piloto possa ser feita. E não basta apenas saber que o Torrador possui um incrível programa que gerencia o queimador e o fluxo de ar no interior do Tambor (OK, estamos nos referindo ao clássico Torrador de Tambor!), que a velocidade desse tambor pode ser manipulada à vontade e etecetera e tal, porém existem outros detalhes técnicos e de engenharia que contam muito. Um deles, por exemplo, é o chamado Tempo de Resposta do Equipamento, definido por um conjunto que compreende o material empregado no tambor e a amplitude da faixa de temperaturas que o Queimador possui.

Um passeio preliminar pelo Torrador, quando se busca conhecer cada recôndito dessas incríveis máquinas, é o início de um promissor trabalho. Nenhum cozinheiro prepara um delicado risoto se não souber corretamente como uma panela responde às diferentes chamas de um fogão poderoso e cheio de recursos. Há que se conhecer bem o conjunto onde o maroto Arroz Arbóreo será trabalhado…

Por outro lado, o pleno conhecimento da Matéria Prima, no nosso caso, a miríade de tipos de sementes de café cuidadosamente colhidos e secados, é pilar fundamental. Saber qual é a variedade, onde e como foi cultivada, como foi colhida e qual o método de secagem empregado dão o tom para se saber qual será o provável comportamento quando for submetido ao mortal tratamento térmico.

Um competente Mestre de Torra tem de dominar este assunto obrigatoriamente. Não é nada razoável um profissional com essa patente desconhecer a Química e a Física das sementes do Café.

Apesar de soar um pouco dramático, um bom Piloto de Torra é aquela pessoa que sabe matar direitinho cada semente de café. Sim, o Mestre de Torra é um “Coffee Seeds’ Serial Killer”!

Os dois primeiros elementos do conjunto estão definidos: Equipamento e Matéria Prima. Torrador e seus recursos, mirabolantes ou não, e as Sementes de Café, com seu rico histórico de vida.

Cabe, agora, ao Mestre de Torra saber o que fazer com esses dois elementos a partir do conhecimento dos recursos e características. Parece pouco, mas não é.

Há hoje uma notável supervalorização de programas de gerenciamento de torra, muito em parte devido aos Mestres de Torra norte americanos, pois muitos deles tem muito boa formação em eletrônica e informática (cabe aqui comentar que os mais criativos que conheci vieram dessas áreas!).

Em razão disso, ocorre com freqüência uma confusão sobre o que realmente representa a Curva de Torra que está na tela do computador, que também pode ser chamada de Curva do Perfil de Torraafinal aquele gráfico representa a Causa ou o Efeito?

A interpretação como Causa é o que move 99% dos atuais programas, pois conversando com todos os Mestres de Torra que os empregam, entendem que o Torrador tem de reproduzir o mais fiel possível aquele gráfico. É como se você estivesse num game bem radical e tentasse com seu carro de Fórmula 1 repetir um trajeto num dado circuito: aceleradas e freadas sucessivas ou alternadas para tentar reproduzir com razoável fidelidade o trajeto.

Porém, no Mundo Real é a sensibilidade do Piloto que ajuda a tomar a melhor decisão em cada momento, como por exemplo, ao notar que o sol está mais quente e os pneus do seu carro estão muito desgastados; certamente, a forma de conduzir será ajustada a cada momento.

A Torra do Café é um conjunto de reações químicas que sintetiza um  dos conceitos científicos básicos: os diferentes grupos de reações ocorrem a cada nível ou faixa de energia atingido pelo sistema, que é sempre crescente.

Reações que promovem transformações moleculares mais sofisticadas somente acontecem quando a quantidade de energia liberada no sistema estiver maior, até se chegar àPirólise, representada principalmente pela oxidação da Glicose.


Portanto, TECNICAMENTE existe um PONTO IDEAL DE TORRA para cada tipo de café, quando suas qualidades sensoriais são perfeitamente preservadas e obtidas. A partir deste conceito, cada Mestre de Torra pode fazer suas variações dentro de sua PREFERÊNCIA, seja com um ponto de Torra mais Escuro ou mais Claro. É  simplesmente uma questão de opção pessoal.

Para facilitar a comparação, ao se cozinhar uma Pasta, o seu Ponto Ideal de Cozimento é o conhecido como AL DENTE, quando o melhor da textura e características sensoriais ficam evidentes. Porém, se o cozinheiro gosta de uma pasta mais molenga, vai deixar com que o cozimento se prolongue, ao passo que, se outro preferir discretamente crua, apresentando os famosos pontos brancos, vai retirar antes de se chegar AL DENTE…

Minha sugestão: desencane, estude sempre e siga para frente!