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São Paulo

The Coffee Traveler by Ensei Neto

SENSORIAL

Filtering by Tag: Terroir

Territórios – 3

Thiago Sousa

Comentei que o Café, como um Produto de Território, apesar da clara influência das coisas daNatureza como o clima e o solo, além das respostas que a Planta dá por tudo isso, tem nas mãos doProdutor a definição que teremos na xícara.

O Primeiro e Mais Importante Conceito que o produtor deve ter em mente é o de que produzir café é antes de mais nada produzir fruta!

Creio que acabo sendo insistente neste conceito, porém a grande verdade é que os cafeicultores geralmente tratam o cultivo de café como o de prosaicos grãos (talvez pelo longo histórico do café em fazer parte do grupo comercial de commodities…) como milho ou soja, onde a visão cartesiana de que basta controlar doenças e pragas, eventualmente dialogar com São Pedro para decidir por uma irrigação ou pedir por chuvas, é o suficiente.

Quando estamos falando de frutas, a primeira coisa que nos vem à lembrança é que fruta boa é fruta madura!

Ninguém em sã consciência compra frutas absolutamente verdes, nem mesmo muito passadas, naquele limiar do estragado. Da mesma forma, colher frutas maduras do cafeeiro deve ser objetivo básico. Afinal, como sempre digo, boas sementes vem de frutas maduras e do cafeeiro queremos apenas e tão somente suas sementes!

Mas, na maior parte da vezes, nem sempre é possível colher apenas os maduros, vindo, em boa parte, aqueles ainda não amadurecidos.

Observe que a atenção e o cuidado do produtor ao fazer a colheita é fundamental, devendo se manter ao longo dos diversos procedimentos para a secagem das sementes. Um desses procedimentos é o de selecionar as frutas pelo seu ponto de maturação depois de colhidas através de equipamentos chamados de lavadores, que fazem este serviço usando a água e a diferença de densidade entre as frutas maduras, verdes e em ponto de passa (secas). O efeito visual deste processo é muito bonito, como pode ser visto nesta foto.

O fato de serem separados frutos secos daqueles ainda com muita água (os maduros, quase maduros e os ainda verdes) facilita o processo de secagem. Há um mito que se criou recentemente: grãos secos como Cerejas Descascados (sementes somente com a casca interna conhecida como Pergaminho) são superiores aos Naturais, que são sementes secadas com as cascas. É o típico caso de se justificar uma ocorrência pelo resultado. E, portanto, um pouco de falta de domínio de conhecimento científico.

Na realidade, o que se busca quando se quer Alta Qualidade  nada mais é do que sementes de frutos maduros, sem qualquer tipo de interferência, seja por contaminação ou causada por fermentações indesejáveis. É óbvio supor que o resultado será muito melhor em termos de uniformidade ao se passar frutas recém colhidas por equipamentos que fazem a seleção pela diferença de densidades (frutas secam flutuam, por exemplo) quando mergulhadas em água e daí passarem por outros que descascarão as frutas por atrito.

E se por acaso a região tiver uma severa restrição de água, como fazer?

A saída é secar com a casca, preparando Naturais.

A bem da verdade, produzir excelentes cafés Naturais exige muito mais cuidado, capricho e conhecimento pelo fato da possibilidade de que diversas floradas possam ter acontecido, gerando frutas em diferentes estágios de maturação. Sim, sem dúvida os resultados são diferentes na xícara, mas por razões absolutamente devidas à fisiologia e bioquímica, que comentarei numa outra oportunidade.

A partir destas pistas, pode-se concluir que apesar da Natureza estabelecer a maior parte das condições do Território como o clima e o solo, sem dúvida é o Produtor que tem nas mãos o poder de não deixar se perder o potencial de qualidade de um lote de café. Pode dizer que a Natureza contribui com 90% dos elementos, enquanto que o Produtor com meros 10% do conjunto; mas para preservar a qualidade sensorial das sementes, é do Produtor 90% da responsabilidade.

Portanto, quem faz o Território é o Produtor!

E vivas para o Produtor!

Territórios – 1

Thiago Sousa

Certamente você já ouviu a palavra Terroir, tão pronunciada ultimamente. De origem francesa, esta palavra pode ser traduzida por Território.

Desde os tempos antigos já se sabia que havia uma estreita relação entre os produtos agrícolas e onde eram produzidos. São bons exemplos as famosasEspeciarias, entre elas o Cravo da Índia e a Canela, que saíam da distante Índia para fazer parte de receitas de pratos servidos à nobreza européia. Sim, os indianos sempre tiveram queda especial para as especiarias, bastante ver como sua rica culinária sempre combina de forma exuberante um conjunto delas.

Tem relação com sua cultura, muito mística, com os aromas intensos que auxiliam na ambientação para a prática da meditação e até do Yoga.  Hoje, como outro bom exemplo, o Tchai é uma bebida que pode ser considerada bastante popular, muito difundida mundo afora pela gigantesca rede Starbucks.

De forma sistematizada, a noção da relação entre Território e Produtos Agropecuários se formou na Europa. Desde o Jamón da Espanha até o arroz cultivado no vale do Rio Pó, passando pelas quase incontáveis regiões vinícolas e produtoras de queijo, a lista é p’ra lá de longa…

Foi o vinho o primeiro produto agrícola a ter um processo deDenominação de Origem. Ao contrário do que muita gente pensa, a primeira Denominação de Origem foi para o Vinho Verde de Portugal no início do Século XX, vindo depois a impressionante série de origens vinhos franceses. Estes foram mais eficientes em propagar pelo mundo que seus vinhos, além do prestígio que já desfrutavam, tinham produção com território definido.

De qualquer forma, os processos foram bastante semelhantes, desde a criação de um organismo que coordenasse os serviços de certificação dos vinhos produzidos, atestando não apenas sua qualidade como também o processo utilizado. Este foi o ponto mais importante para que um modelo de criação do que podemos chamar deTerritórios de Produção pudesse ganhar espaço.

Caf__doCerrado_H2O_1.JPG

Falar em Terroir é relacionar as condições geográficas, como o local de produção, o clima e o solo, além dos aspectos botânicos e, não menos importante, o papel do produtor. Tudo tem de funcionar bem, harmonicamente. No caso do café, o namoro com as Denominações Geográficas é algo recente.

Apesar de ter sido a primeira região produtora no mundo a se organizar para obter uma Denominação Geográfica, o Cerrado Mineiro perdeu essa oportunidade ao receber uma Indicação de Procedência pelo INPI quase 6 meses após a região de Vera Cruz, no México.

Um dos requisitos mais importantes para uma região receber a Indicação de Procedência, no caso específico do Brasil, a Notoriedade, que é o reconhecimento pelo mercado de um atributo que seja relacionado diretamente com uma determinada origem, tem grande peso, assim como acontece para a Denominação de Origem, dada pela WIPO.  Apesar de sua história recente, o Cerrado Mineiro construiu a partir das boas condições climáticas a fama de origem produtora de cafés de boa qualidade dentro do Brasil, confundindo, por vezes, a origemcom o conceito de qualidade superior.

Se uma região com o Cerrado Mineiro, mesmo que demarcada e reconhecida pelo Governo do Estado de Minas Gerais, com uma gigantesca área abrangendo 55 municípios, obteve sua IP – Indicação de Procedência, uma micro região poderia conseguir algo semelhante mais facilmente. Foi justamente esta linha de pensamento que norteou a demarcação da Micro Região da Face Mineira da Serra da Mantiqueira, liderada pela APROCAM – Associação dos Produtores de Café da Mantiqueira, na hoje renomada Carmo de Minas. Sua IP foi concedida neste ano de 2011, após quase 6 anos de tramitação do processo junto ao INPI.

E sobre sua notoriedade? Bem, cafés que são cultivados numa área particularmente montanhosa, a belíssima Serra da Mantiqueira, com o adicional de dividir um dos mais ricos mananciais de água mineral do Brasil, só poderiam resultar em bebidas de boa complexidade de notas de sabor, intensos aromas e quase sempre exuberante acidez cítrica.

Tudo isso é resultado da combinação que um Território pode proporcionar.

Sobre as fotos: 1- lavouras em São Roque, montanhas do Espírito Santo; 2 -lavoura sombreada em modelo agroflorestal em Piatã, Chapada Diamantina, BA; 3 – Selo do Café do Cerrado, hoje substituído pelo Selo da Região do Cerrado Mineiro; 4 – Selo de Origem para os Cafés da Mantiqueira.